‘Quem não pratica a fé não é evangélico’

“Canta minha alma, canta ao Senhor, rende-lhe sempre ardente louvor”. Marta e Ricardo entoam com alegria o cântico projetado na parede da igreja, ao som da guitarra elétrica do irmão que anima a oração nesta manhã de domingo. O filho Filipe ainda assiste ao culto, que dura mais de uma hora, entre o colo da…

‘Quem não pratica a fé não é evangélico’

Vêm todos os domingos à Igreja Baptista da Lapa, em Lisboa, para o culto que junta várias dezenas de famílias cristãs evangélicas. Para muitos, a manhã de oração começa às 10h30, com a escola dominical, uma espécie de catequese para ensinar crianças e adultos a lerem a Bíblia, na qual se centra toda a vivência espiritual protestante.

Sem imagens nem símbolos

A igreja está cheia de gente mas despida de ornamentos (imagens e símbolos religiosos), bem ao estilo protestante: apenas uns bancos corridos, um altar e um púlpito. Há muitos bebés, crianças e casais novos, pois a comunidade foi refundada há poucos anos e tem à sua frente um pastor jovem que atrai muitos da sua idade.

É ele quem faz a pregação, que se segue aos cânticos, aos salmos e  às primeiras saudações, sempre num jeito muito informal que contrasta com o cerimonial católico. Hoje, o pastor Tiago Cavaco pega numa carta de São Paulo aos Efésios para falar da morte: “Quando vemos a morte à espreita vivemos com mais vida”, explica, num sermão que dura mais de 15 minutos.

Como é o primeiro domingo do mês, há também distribuição da ceia do Senhor: o pão e o vinho são dados a comer e a beber a todos os que foram batizados em adultos e por imersão. Neste gesto semelhante à eucaristia celebrada pelos católicos, há uma diferença fundamental: “Não acreditamos na consubstanciação”, explica ao SOL o líder espiritual da comunidade. Ou seja, o vinho e o pão são elementos que trazem à memória a última ceia de Cristo, não são o corpo e o sangue de Cristo como creem os católicos.

Rezar na igreja e em família

Filhos, netos e bisnetos de evangélicos batistas, Marta, 33 anos, e Ricardo, 37, foram educados num ambiente religioso, frequentaram os grupos de jovens (ela em Viseu e ele em Queluz) e “naturalmente” casaram na igreja que os viu crescer. Apesar de um evangélico não estar obrigado a casar com alguém que professe a mesma fé – há até a possibilidade de casamentos mistos – o casal admite que é mais fácil quando isso acontece. “É difícil viver uma fé que seja um favor, uma cedência ao outro” diz Ricardo. “E educar conjuntamente os filhos sem ter por base os mesmos valores”, acrescenta Marta.

Em casa de Marta e Ricardo reza-se antes das refeições e à noite faz-se o culto doméstico. “Cantamos músicas com os miúdos, fazemos algumas petições e decoramos um versículo da Bíblia”, explica a mãe de Rafael e Filipe. A vida social desta família passa muito pela igreja e pelos amigos que professam a mesma fé. Ao domingo, além do culto que dura toda a manhã, participam nos encontros de apoio às famílias que se realizam à tarde.

Ricardo pertence à assembleia da igreja (conjunto de 59 membros onde assenta a autoridade da comunidade e se tomam as decisões) e Marta dava lições às crianças até ao nascimento do bebé.

Fora da igreja, a vivência religiosa perpassa as outras áreas da vida, como o trabalho, reconhece esta assistente social: “Já estão habituados. Sabem que não é para impor nada, nem convencer. Mas falo do que acredito”. Não podia ser de outra maneira, defende o mentor espiritual da sua igreja. Aqui não há evangélicos não praticantes, diz Tiago Cavaco. “Quem não pratica a fé, não é evangélico”.