Máfia do Sangue. Libertação de Lalanda de Castro não anula processo de extradição

Juiz alemão defendeu que não existem fundamentos para o mandado de detenção europeu expedido por Portugal

O ex-diretor da Octapharma, Paulo Lalanda de Castro, foi libertado ontem, na Alemanha, depois de ter sido detido por suspeita de corrupção passiva nos negócios do plasma – a chamada Operação O-Negativo. O juiz alemão que analisou o pedido de prisão provisório das autoridades nacionais considerou que não existiam fundamentos para o mandado de detenção europeu. Recorde-se que, por norma, a decisão definitiva relativa ao cumprimento de um mandado de detenção europeu “deve ser tomada no prazo de 60 dias após a detenção”.

No entanto, esta libertação não anula o processo de extradição iniciado por Portugal. E o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes, reiterou ontem a disponibilidade do suspeito para prestar declarações às autoridades portuguesas – resta, assim, saber se o seu regresso a Portugal se fará ou não ao abrigo do processo de extradição, aguardando-se uma posição do Ministério Público. Ao i, o advogado explicou que Lalanda de Castro está disponível para vir para Portugal de livre e espontânea vontade ou, se as autoridades assim o desejarem, ao abrigo do mandado.

A detenção de Lalanda e Castro ocorreu na quarta-feira da semana passada, nos escritórios da Octapharma, em Heidelberg. A Polícia Judiciária explicou na altura através de um comunicado, que a detenção do “ex-administrador de uma empresa farmacêutica” se tinha realizado em colaboração com as autoridades alemãs.

No âmbito da operação ‘O-Negativo’, foi também detido Luís Cunha Ribeiro, ex-presidente do INEM e da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo. Em causa estão suspeitas de corrupção passiva. O caso do plasma envolve outros três arguidos – os advogados Paulo Farinha Alves e Barros Figueiredo, e Elsa Morgado, da Associação Portuguesa de Hemofilia.

O Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa considera existirem indícios de que Lalanda e Castro e o ex-presidente da ARS de Lisboa Cunha Ribeiro “terão acordado entre si que este último utilizaria as suas funções e influência para beneficiar indevidamente a empresa do primeiro”. “Em causa estão factos suscetíveis de integrarem a prática de crimes de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem e branqueamento de capitais”, explicou o MP na altura da detenção.

Paulo Lalanda de Castro é também arguido na Operação Marquês e foi acusado no caso Vistos Gold. No Brasil a Octapharma – farmacêutica cuja representação para a América Latina chegou a estar a cargo do ex-primeiro-ministro José Sócrates – também foi investigada num caso que ficou conhecido como Máfia dos Vampiros.

Detenção “ilegal” Sá Fernandes já tinha revelado que o ex-administrador da Octapharma tinha pedido a revogação do mandado de detenção europeu.

O advogado, que assumiu a defesa de Lalanda neste processo, chegou mesmo a descrever este episódio como “ilegal” e “abusivo”, declarando que o seu cliente comunicou sempre o seu paradeiro às autoridades e manifestou disponibilidade para prestar declarações. Foi assim apresentado um requerimento ao Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, a solicitar a revogação do mandado.

Estado intervém Como o i noticiou recentemente, o Instituto Português do Sangue e da Transplantação vai ter de apresentar um plano operacional para a utilização do plasma colhido em Portugal e passar a garantir o fornecimento aos hospitais públicos, estando estes proibidos de comprar plasma a privados a partir do final do primeiro quadrimestre de 2017. Esta tomada de posição avançou após a detenção de Cunha Ribeiro – antes de Lalanda de Castro ser detido.

Segundo dados disponibilizados pelo Infarmed, entre 2009 e 2014 a Octapharma deteve o monopólio do fornecimento de sangue e plasma nos hospitais portugueses. A empresa faturou 200 milhões de euros neste período.

Com Carlos Diogo Santos