Chamas sobre o rio

Ao rondar das dez e meia da manhã do dia 9 de Janeiro de 1943, Lisboa viu chamas caírem do céu sobre o Mar da Palha. O hidroavião pertencia à companhia britânica British Overseas Airways Corporation (BOAC) e tinha o nome de Golden Horn. Há vários dias que se encontrava parado no Aeroporto de Cabo…

É preciso dizer que tal era vulgar nos hidroaviões desse tempo. Os casos repetiam-se.

Finalmente, de Inglaterra chegou um novo motor para o Golden Horn.

Por vezes, encontravam-se em Cabo Ruivo cinco, seis ou sete aparelhos estacionados ao mesmo tempo.

Nessa manhã de Janeiro, o piloto decidiu fazer um voo teste com o novo motor. Geralmente, estes testes eram realizados por apenas pilotos e engenheiros. Nem as regras de controlo aéreo permitiam civis a bordo em situações como esta.

Mas aconteceu.

Foi conversa do dia em todo o país, não apenas em Lisboa.

As manchetes dos jornais berravam: “Tragédia no Tejo!”

Quinze mortos!

As testemunhas falavam de uma explosão, no ar, enquanto o Golden Horn fazia uma manobra de amaragem. Apenas destroços caíram sobre o rio.

Nunca se saberá o que levou o comandante John Henry Lock a permitir que tantas pessoas embarcassem naquele fatídico voo teste. Cinco corpos foram encontrados de imediato: os do capitão Lock, do motorista Júlio Sousa – proprietário de dois automóveis que faziam o percurso Beixa-Cabo Ruivo-Baixa -, e de mais três mulheres: Rosalina Monteiro Alves; Cândida Chamiço Ribeiro Heitor, Maria Fernandes Marques Paixão.

Faltava encontrar o paradeiro de mais oito vítimas: Daniel Costa Figueiredo, guarda-fiscal, José Martins Osvaldo Ferrão Botelho, Patrick Allen Barr e Gregory Lambert, ambos pilotos, Walter Priest e Reiser, mecânicos, e Herbert Courtney, o encarregado das manobras de amarração.

Uttley, o radiografista, foi cuspido antes do hidroavião se despenhar. Sobreviveu e foi uma testemunha importante no relatório posterior levado a cabo pela Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE).