Os manuais escolares não vão estar adaptados às alterações curriculares que o ministério da Educação pretende introduzir no próximo ano letivo, a chamada flexibilização curricular.
Os livros começam a ser trabalhados pelas editoras pelo menos com um ano de antecedência e até agora a tutela ainda não forneceu qualquer indicação concreta sobre o que deverá ser alterado. Se a mudança nas disciplinas avançar mesmo no próximo ano letivo, como garante o Governo, alunos e professores arriscam-se a ter de usar manuais desatualizados.
A flexibilização curricular – que vai trazer novas regras e conteúdos para os 1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade – entra em vigor em setembro e os manuais continuarão a ter o conteúdo antigo. O SOL sabe este assunto esteve em cima da mesa numa reunião com a tutela há um ano mas, desde então, não houve indicações precisas sobre o que deve ser mudado. A desatualização afetará não só os livros que são comprados pelas famílias mas também os manuais adquiridos pelo Ministério da Educação (ME) para serem distribuídos gratuitamente aos alunos do 1.º ciclo. Também os livros de fichas e conteúdos digitais correm o risco de ter conteúdos desatualizados.
Apesar de ainda não serem conhecidos os detalhes das alterações, que o Ministério da Educação quer aplicar já no próximo ano letivo, a tutela já fez saber que quer «emagrecer» os currículos das disciplinas de forma a que os conteúdos se resuma ao que «é essencial». Ou seja, há conteúdos nos anos em início de ciclo – 1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos – que vão desaparecer.
Além disso, o Secretário de Estado da Educação João Costa já disse que haverá uma redução do número de horas a Português e Matemática, acompanhada de um reforço de horas a História e Geografia. Haverá ainda o regresso das disciplinas extracurriculares de Formação Cívica e da Área Projeto.
As escolas, que dizem não ter sido ouvidas nem informadas diretamente pela tutela sobre as alterações que estão a ser estudadas, dizem ao SOL que, com base na informação que tem sido disponibilizada, as alterações nos currículos prometem ser «profundas» e «estruturantes».
Ao SOL, o Ministério da Educação garante, porém, que «os cenários possíveis sobre o currículo ainda estão a ser estudados». A tutela diz mesmo que, por esta altura, «não há razões para prever necessidade de alteração nos manuais».
Escolas temem ‘fortes constrangimentos’
Sem se saber ao certo o que irá acontecer, as escolas temem que a desatualização dos manuais traga «fortes constrangimentos» para professores e alunos, que terão de trabalhar e fazer exercícios em manuais e livros de fichas com conteúdos diferentes dos programas.
«Será muito difícil fazer alterações de raiz aos currículos» sem as alterações aos manuais, avisa o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), Manuel Pereira.
O diretor lembra que os professores continuam a «estar altamente dependentes dos manuais» e que, por isso, sem a adaptação dos mesmos «haverá uma fortíssima limitação para pôr em prática o novo programa».
A opinião é partilhada pelo presidente do Conselho de Escolas, José Eduardo Lemos, que sublinha que «os manuais escolares devem estar adaptados aos currículos que estão em vigor», de forma a evitar «constrangimentos» e para que o alunos acompanhem pelo livro as «matérias que vão sendo lecionadas».
Também o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, partilha desta opinião. O diretor lembra, no entanto, que o manual deve ser encarado como «um auxiliar» no ensino. Ou seja, «não é o programa» e os professores devem conseguir adaptar-se.
Ministério não falou com editoras
Em janeiro de 2016, apurou o SOL, as editoras reuniram-se com o Ministério da Educação e questionaram a tutela sobre as alterações aos conteúdos das disciplinas que seriam aplicadas na flexibilização do currículo. Nessa altura, terão informado o ME que desde o início de 2015 estavam a trabalhar na atualização dos manuais para os 1.º e 5.º anos, uma vez que os livros são alterados a cada seis anos. Como se tratava de anos de escolaridade que iriam ser abrangidos pela reforma então já anunciada pela tutela, as editoras disseram estar disponíveis para refazer a adaptação dos conteúdos às novas regras.
O gabinete de Tiago Brandão Rodrigues não terá dado qualquer resposta às editoras e os manuais que chegaram este ano aos alunos – e que de acordo com a lei vão estar em vigor durante os próximos cinco anos – foram desenhados com os conteúdos do currículo em vigor, que em setembro ficará desatualizado. Contactada pelo SOL, a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) recusou fazer comentários.