Fobia ao turismo alastra na Europa

Há taxas, limitações ao número de visitantes que podem entrar por dia nas cidades e até proibições em plataformas de alojamento ou licenças de construção para novos hóteis.

Os números chegam das mais variadas fontes e não deixam margem para enganos: o turismo continua a crescer em Portugal e é já um dos maiores suportes da economia nacional. A verdade é que o país nunca recebeu tantos turistas como agora e isso tem contribuído para um aumento das receitas na hotelaria e nas companhias aéreas. O ano de 2016 acabou por ficar na história nacional como o melhor ano de sempre no setor. Todos aplaudiram. Este ano a tendência manteve-se e muitos são os empresários que acreditam que o turismo vai continuar a atingir recordes atrás de recordes. Mas é exatamente no meio de todo este cenário de crescimento que se começam a levantar algumas vozes que chamam a atenção para a necessidade de ser estabelecido um plano de crescimento mais sustentável.

A discussão em torno deste assunto ganha cada vez mais relevância e é suportada pelo facto de a ONU ter declarado o ano de 2017 o Ano Internacional do Turismo Sustentável para o Desenvolvimento. Mas em que consiste afinal este ponto na agenda internacional? A ideia é alertar para a necessidade de todos reconhecerem «a importância do turismo internacional e, em particular, a designação de um ano internacional de turismo sustentável para o desenvolvimento, para promover uma melhor compreensão entre os povos em todo o mundo, levando a uma maior consciencialização sobre o rico património das diversas civilizações».

Até porque, se por um lado as pessoas viajam cada vez mais, há também cada vez mais cidades a colocar um travão na entrada de estrangeiros. A verdade é que em algumas cidades europeias já está aberta a caça ao turista. Há quem avance mesmo que o turismo de massas está a caminho de uma verdadeira explosão social. Assistimos a cada vez mais manifestações, há queixas por causa do aumento das rendas e dos custos de vida. Os velhos habitantes falam de uma invasão e os governos tentam fazer face ao crescimento do número de turistas.

O que não faltam são exemplos de medidas criadas por vários países e a promessa é que os casos se comecem a multiplicar.

 

Barcelona quer porta fechada

No ano passado, a cidade recebeu mais de 32 milhões de visitantes. Há quem se queixe de ter deixado de andar nas ramblas para evitar as centenas de turistas que lá passam todos os dias. E quem pensa que para os comerciantes as notícias são apenas boas, desengane-se. A maioria assegura que são mais os que apenas passeiam e tiram fotografias do que os que compram alguma coisa.

Uma forma de proteger mais a cidade do turismo de massas passa por aplicar taxas e é neste sentido que o governo tem estado a ponderar aplicar um imposto de 0,65 euros por cada turista que fique na cidade por menos de 12 horas.

«Se não queremos acabar como Veneza, temos de impor limites», explicou Alda Colau, a presidente da câmara local, quando tomou posse. Uma das primeiras medidas foi criar, logo em janeiro deste ano, uma proibição de novas licenças para a construção de hotéis. 

O movimento contra os turistas na cidade já chegou mesmo a furar os pneus de  bicicletas dos turistas e é frequente ver frases como «voltem para casa» nas mais variadas ruas da cidade.

Entretanto, outras regiões espanholas já colocaram também a turismofobia no vocabulário. Em Palma de Maiorca, por exemplo, os protestos também se repetem.

 

Exemplos multiplicam-se

Em Londres, Inglaterra, uma das medidas aplicadas para controlar o número de turistas que procuram a cidade foi criar um limite de alugueres em plataformas como o Airbnb. Por ano, há uma limitação de 90 dias por cada imóvel. Já em Milão, onde para já as medidas ainda são tímidas, foi proibida a selfie sticks e garrafas de plástico em algumas das principais áreas da cidade.

Também em Berlim têm estado a ser pensados caminhos para regular a entrada de turistas estrangeiros. Desde o início do ano passado que as plataformas de aluguer de curta duração deixaram de poder funcionar na cidade. Podem alugar-se quartos, mas apartamentos está fora de questão. As multas para quem desrespeitar a diretiva chegam aos 100 mil euros. Com ou sem controlo nas plataformas, os movimentos contra o turismo de massas ganham cada vez mais espaço numa velha Europa, que recusa receber tanto sangue novo. Na Croácia, em Dubrovnik, está a ser analisada a possibilidade de limitar a entrada de cruzeiros. Atualmente, a cidade pode receber cinco navios por dia, mas isto pode mudar muito em breve. A ideia é que passem a atracar apenas dois. A cidade, que foi placo de gravações da famosa série Game of Thrones, assistiu a um aumento da procura sem precedentes. Para já, está estipulado que só pode receber cerca de seis mil visitantes por dia, isto depois de ter começado a receber mais de dez mil.

Também em Roma já foram tomadas várias medidas. Os problemas com turistas obrigou a cidade a destacar alguns seguranças para zelarem pelas fontes da cidade. Além do limite de visitantes que podem aceder a alguns locais emblemáticos, existem multas de 240 euros para quem entrar ou se sentar em redor das fontes.

A estas regiões junta-se ainda Santorini. Com a entrada de cerca de 10 mil pessoas por dia, principalmente por causa dos cruzeiros, a ilha estipulou um máximo de pessoas que podem entrar por dia. Agora, a ilha passa a receber apenas oito mil por dia e ponto final.

Veneza é um outro exemplo. Falamos de uma região que tem cerca de 50 mil habitantes, mas recebe diariamente mais de 60 mil. Contas feitas é o suficientes para que os habitantes locais reclamem que sejam tomadas medidas. Para já, foi implementada a proibição de abrir novos restaurantes fast food e foram instalados controladores automáticos em várias zonas. Em cima da mesa está agora uma possível limitação do número de pessoas que podem entrar em Veneza.

Mais exemplos existem um pouco por todo o lado. Por exemplo, à semelhança de outros países europeus, também a Áustria cobra taxas aos turistas, mas à saída. Neste caso, o dinheiro angariado reverte para medidas ligadas ao ambiente. Assim, quem sair do país paga oito euros, se a viagem for dentro da Europa, ou 40 euros para o resto do mundo.

Também Amesterdão está na lista de cidades que tem vindo a tentar diminuir o número de turistas estrangeiros. «Preferíamos que as pessoas ficassem algumas noites, visitassem museus e comessem fartas refeições nos restaurantes. Mas a maior parte das pessoas vem cá, passa só o fim de semana e passeia pelo Red Light Discrict», sublinha Udo Kock, responsável municipal com pelouro das Finanças. Para ajudar a uma mudança no hábito dos viajantes, a ideia é aumentar as taxas turísticas pagas por noite. O aumento poderá chegar aos 10 euros.