O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP)arquivou o processo relativo à compra dos terrenos da Herdade de Rio Frio, financiada pelo BPN em 2004, um caso extraído do processo principal. Em causa estavam acusações de burla e de branqueamento de capitais.
A Parvalorem, sociedade criada pelo Estado para gerir o chamado ‘lixo tóxico’ do banco, apresentou uma queixa relativa à compra de 1440 hectares de terrenos na Herdade de Rio Frio feita pelos empresários Emídio Catum e Fernando Fantasia, ambos arguidos no processo, e financiada pelo BPN.
As contas da Parvalorem preveem que os prejuízos para o Estado foram na ordem dos 70 milhões, devido à perda de créditos e garantias (hipotecas), que agora com o arquivamento ficam a pesar nos cofres do Estado.
O Ministério Público considera que não houve lugar a burla, pois o banco estaria a par de todas as movimentações de dinheiro nos negócios que se foram sucedendo, uma vez que tudo se passou dentro da estrutura do BPN.
O negócio em causa remonta a abril de 2004, quando a Domurbanis fez um pedido de financiamento de 35 milhões de euros ao BPN – liderado então por José Oliveira Costa, que chegou a ser sócio de Catum e de Fantasia noutros negócios – com vista à aquisição de terrenos da Herdade de Rio Frio, em Palmela.
O banco fez a avaliação pelo valor de 85 milhões, aceitando o pedido de financiamento. A escritura foi então celebrada em julho de 2004, e nela constava a quantia de 51 milhões de euros como valor máximo garantido pela hipoteca.
No fim de março de 2005, foi concedido novo crédito à Domurbanis, no valor de 8 milhões de euros, para desenvolvimento de projetos imobiliários nos terrenos comprados. Um mês mais tarde foi concedido novo financiamento, de 10 milhões de euros, para dar continuidade ao investimento.
Em 2007, a Domurbanis decidiu vender os terrenos a um fundo de investimento imobiliário do BPN por 53 milhões de euros, ficando estipulado na nova escritura que o negócio seria celebrado «livre de quaisquer encargos ónus e encargos, designadamente das hipotecas registadas a favor do BPN».
Os cancelamentos caberiam ao banco. «Competia ao Banco concedente do crédito, no ato da escritura, ao apresentar as declarações de cancelamento das hipotecas, assegurar-se da amortização/liquidação do valor do empréstimo, o que, efetivamente não foi feito. Não podendo, tal incúria, assacar-se a qualquer especial astúcia empregue pelos vendedores (Domurbanis)», lê-se no despacho.
O problema é que a sucessão de negócios, com pedidos de crédito e hipotecas, gerou diferença de valores, e a quantia recebida por Catum e por Fantasia pela venda dos terrenos ao fundo do BPN não foi utilizada «no todo ou em parte na amortização dos créditos concedidos pelo BPN que ascendiam, globalmente a 53 milhões de euros».
Este facto assenta numa das justificações da queixa da Parvalorem, para a qual «com a não regularização e amortização dos créditos concedidos pelo BPN à Domurbanis, o dinheiro da venda dos terrenos foi utilizado em proveito dos arguidos», entre eles Emídio Catum e Fernando Fantasia.
No entanto, o Ministério Público concluiu não estarem reunidos os critérios para que as ações constituam os crimes em causa. Aliás, no despacho de arquivamento pode ler-se que «o não pagamento/liquidação/amortização dos créditos concedidos pelo BPN à Domurbanis [empresa detida por Emídio Catum e Fernando Fantasia] foi solicitado e consentido pelo próprio banco», é referido no documento, assinado pela procuradora Maria Manuel Cachim.
Dualidade de critérios?
Por outro lado, um caso semelhante, também extraído do processo principal do BPN, está já na fase de alegações finais.
Em causa está a acusação de burla qualificada, fraude fiscal e abuso de confiança, imputados a Arlindo Carvalho e outros arguidos. O objeto do processo também tem na base uma sucessão de negócios sobre imóveis.
A acusação alega que Arlindo Carvalho, em coautoria com José Neto, terá recebido indevidamente cerca de 80 milhões de euros do BPN e do Banco Insular de Cabo Verde, ao servirem de uma espécie de testas-de-ferro de Oliveira Costa e de outros altos dirigentes do grupo BPN/SLN, que estaria a diversificar as áreas de atuação do banco, como forma de escapar à supervisão do Banco de Portugal.
O antigo ministro alegou que foi convidado para o negócio pelo próprio banco e que, a exemplo do processo arquivado, tudo terá sido feito com o conhecimento da administração do BPN, que lhe autorizou os financiamentos..