60 carros apreendidos a administrador da GPS

Cinco administradores do maior grupo de colégios acusados de corrupção por uso indevido de 30 milhões de euros do Estado. José Canavarro e ex-diretor regional entre os arguidos.

A PJ apreendeu mais de 65 carros a apenas dois administradores do grupo GPS (Gestão e Participações Sociais) que terão sido adquiridos com verbas que o Ministério da Educação enviou para os 15 colégios através de contratos de associação.

No total, o grupo GPS, sedeado em Leiria, tem cinco administradores e todos estão acusados de crimes como corrupção ativa, peculato, falsificação de documentos, burla qualificada e abuso de confiança qualificado, alegadamente, por terem usado mais de 30 milhões de euros dos cofres do Estado em viagens, cruzeiros, carros, mobílias, refeições e até mesmo champanhe. Entre os administradores estão António Calvete, ex-deputado do PS, Manuel Madama, António Madama, Fernando Catarino e Agostinho Ribeiro, que foram professores ou diretores dos colégios.  

De acordo com a acusação do Ministério Público – a que o SOL teve acesso -, as verbas terão sido usadas indevidamente entre 2005 e 2013 e, no total, durante esses nove anos, o grupo recebeu mais de 300 milhões de euros do Ministério da Educação para os contratos de associação. 

Além dos cinco administradores do grupo, que detém mais de 50 empresas de diversas áreas, está ainda acusado por corrupção passiva o ex-secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa, José Canavarro, que esteve na 5 de Outubro durante o Governo de Santana Lopes. De acordo com a acusação, o ex-governante terá favorecido financeiramente o grupo através de autorizações – assinadas cinco dias antes de sair do Governo –  para abertura de quatro colégios (dois em Mafra e outros dois nas Caldas da Rainha) que iriam receber dinheiros públicos através dos contratos de associação. Foi ainda autorizada por Canavarro a abertura de mais turmas com contratos de associação num dos colégios que estava em funcionamento. Estas autorizações terão sido concedidas após uma reunião que decorreu «em outubro ou novembro» nas instalações do Ministério da Educação, onde estiveram presentes os administradores do grupo GPS, José Canavarro e o ex-diretor regional de Educação de Lisboa, José Maria de Almeida – que também está acusado de corrupção passiva. 

Depois de sairem do Governo e da Direção Regional de Educação, tanto Canavarro como José Maria de Almeida acabaram por prestar serviço como consultores para o grupo GPS, entre 2006 e 2011. 

O MP quer que Canavarro devolva ao Estado os cerca de 224 mil euros que terá recebido do grupo GPS em salários e em contrapartidas. No caso de José Maria de Almeida, este valor é de cerca de 80 mil euros.  

Contactado pelo SOL, José Canavarro diz que a «acusação não tem qualquer fundamento» e que vai pedir a instrução do processo, evitando, desta forma, ir a julgamento. O ex-governante explica ainda que os «contratos referidos na acusação foram celebrados 20 meses depois da saída do Governo», a 6 de novembro de 2006. Documentos estes que diz que apresentou ao MP. Sobre a devolução dos 220 mil euros, não responde.

Viagens, cruzeiros e refeições

A acusação apresenta uma longa lista de refeições, de viagens, de carros e de mobílias, entre outros bens que terão sido pagos através de verbas públicas de contratos de associação. É através destes contratos firmados com os colégios desde os anos 80 que o Ministério da Educação financia turmas de escolas privadas onde há carências de escola pública. Desta forma, as famílias ficam isentas de pagar as propinas dos alunos. 

Além de receberam as verbas através dos contratos de associação, os administradores que estão acusados deram ainda conta ao Ministério da Educação de diversos funcionários «que, na verdade, não existiam», de forma a que lhes fosse transferido o salários desses funcionários para poderem arrecadar as verbas que não lhes eram devidas. Para os salários de funcionários que «não existiam» foram transferidos mais de 800 mil euros. 

Ao todo, entre 2005 e 2013, o grupo de 15 colégios GPS terá recebido um valor acima dos 300 milhões de euros, tendo em conta que um dos colégios – o D. João V – tem contratos de associação desde 1986. No entanto, o prazo de prescrição dos eventuais ilícitos económicos cometidos em funções públicas, que é de dez anos nos casos de corrupção passiva no setor privado, impediu que a investigação analisasse as verbas recebidas antes de 2005.

Só em refeições, os valores ascendem a 44.012,60 euros gastos ao longo de oito anos, entre 2005 e 2012. Em 2005, o espaço de eleição para as refeições dos administradores do GPS foi o restaurante A Taberna, em Coimbra. Nesse ano, ao todo, foram gastos 6.223,40 de euros, de acordo com faturas apresentadas pelo arguido António Calvete. 

Entre as despesas apresentadas pelos administradores da empresa encontram-se ainda viagens e alojamentos, com um valor que ascende a 130.633,91 euros, incluindo, em 2005, um cruzeiro nas Caraíbas do Sul, no valor de 21.048 euros. Foram ainda registadas viagens e alojamentos pagos para quatro pessoas a Luanda e Tenerife; cruzeiros em Porto Rico para duas pessoas; viagens e estadias em Cabo Verde ou Londres e inclusivamente na Madeira.

Foram ainda desviados 426.987,99 euros em numerário de receitas do bar e papelaria dos colégios e outros 34 mil euros em empréstimos.

Em 2014, foram realizadas buscas a casa de José Canavarro e dos administradores do grupo. Durante essa operação foram apreendidos 60 carros – incluindo um Porsche, um BMW X3 e um Audi A6 – que foram atribuídos a Manuel Madama. E na casa de seu filho, António Madama, foram apreendidos outros sete carros. 

O processo de investigação do MP, que durou quase quatro anos anos, foi desencadeado depois de em 2014 o Ministério da Educação – na altura aos comandos de Nuno Crato – ter enviado para o MP os resultados de auditorias realizadas pela Inspeção Geral da Educação a seis colégios do grupo, durante o verão de 2012.