A história da Taça de Portugal

O Campeonato de Portugal (entre 1921 e 1938) transformou-se na taça mais popular do país mas que não costuma contemplar os mais frágeis.

Taça de Portugal. A designação surgiu a partir da época de 1938-39.  Há quem tenha lançado polémicas recentes sobre as nomenclaturas das provas nacionais, mas parece-nos que o que foi aprovado no Relatório e Contas da Federação Portuguesa de Futebol dessa mesma época, artigo VI, não deixa margem para grandes especulações: «Por virtude da reforma a que se procedeu no Estatuto e Regulamentos da Federação, os Campeonatos e Ligas de Portugal passaram a designar-se, respetivamente, Campeonatos Nacionais e Taça de Portugal». E isto em estreita obediência ao que já fora consignado no I Congresso Nacional do Futebol sob o título de A Organização Nacional do Futebol e as suas Grandes Competições Nacionais. 

Quando se deu início à primeira edição da Taça de Portugal, ganha pela Académica de Coimbra ao Benfica pelo suculento resultado de 4-3, já se haviam disputados dezassete Campeonatos de Portugal. E a imprensa da época foi unânime em estabelecer listas de continuidade para os vencedores das duas denominações da prova ainda que não fizesse retroativamente uma unificação do nome da competição. Deste modo, ao vencedor do Campeonato de Portugal de 1937-38, o Sporting (final ganha ao Benfica por 3-1) seguia-se, naturalmente, a Académica e por aí adiante até aos dias de hoje.

Para que se perceba ainda mais simplesmente a realidade em questão, preste-se atenção ao troféu em disputa amanhã, entre Sporting e Desportivo das Aves. É exatamente o mesmo que está em causa desde 1921-22. Ou melhor: a Taça de Portugal, imponente e autêntica, não se disputa; disputa-se uma réplica, mais pequena, menos sumptuosa. A original está na sede da FPF e recebe, desde esse já longínquo ano de 1922, uma chapa prateada com o nome do vencedor mais recente.

Oficialmente, escreva-se: «O troféu oficial da Taça de Portugal pertence à Federação Portuguesa de Futebol. O troféu, totalizando 20 Kg de peso, é constituído por uma taça em prata cinzelada e ornamentada em estilo manuelino, assente numa base de madeira onde são inscritos os nomes dos vencedores. Ao vencedor de cada edição é entregue uma réplica, de menor dimensão que a original. O troféu outrora entregue aos vencedores do Campeonato de Portugal (1921–1938) é idêntico ao da Taça de Portugal, estando inscritos igualmente, e sem distinção, na base do troféu oficial o nome de todos os vencedores de 1921–22 até ao presente».

Para discussão, já basta. Agora é fazer o vosso jogo, senhores, como diria qualquer croupier.

Sporting contra FC Porto

Por uma questão de simplificação, vamos referir-nos aqui só à Taça de Portugal com esta designação. E vamos acrescentando os dados imprescindíveis que surgem entre 1921 e 1938.

O Sporting não joga hoje apenas contra o Desportivo das Aves, estreante absoluto em finais, mas contra a história e contra o FC Porto. Porque no que respeita exclusivamente à Taça de Portugal soma 16 vitórias, as mesmas que o seu rival do norte, ambos a dez de diferença do Benfica, que tem 26 no bornal. Aliás, no campeonato de Portugal também ficaram ela por ela, com quatro vitórias cada um, uma acima de Benfica e Belenenses. Já quanto a finais, o FC Porto leva vantagem: 29 no total contra as agora 28 dos leões. Tudo muito para o empatadinho.

O Desportivo das Aves tornou-se uma surpresa agradável, se assim se pode dizer, já que o espírito da Taça de Portugal passa, precisamente, por dar a oportunidade – jogos a eliminar – às equipas menos poderosas de se aproximarem dos grandes.

Mas, convenhamos: com 58 vitórias no total, os Três Gigantes cá da paróquia atlântica são absolutamente açambarcadores desse bonito troféu que costuma alegrar, ano após ano, um domingo de Junho do Vale do Jamor, entre sardinhas assadas e bifanas e um ou outro courato, às vezes com pêlo e tudo, metendo pelo meio uns copázios de tinto de viva lá o seu compadre. E o resto, como dizia o franco Vilaça, do divino Eça, não passa de chinfrineira.
Os outros, os não-Gigantes, somam no total, dezanove troféus. A diferença é grande, abissal. O Boavista destaca-se: tem cinco taças. O Belenenses tem três, como o Vitória de Setúbal, mas desempata com os Campeonatos de Portugal, ganhando nessa matéria aos sadinos por três-a-zero. Duas para Braga e Académica, esta a suportar um jejum de 73 anos entre os dois triunfos, aquele a experimentar uma fome de 50.

Há em seguida os intrometidos. Olhanense. Marítimo e Carcavelinhos (que se transformou no Atlético depois da fusão com o União de Lisboa), no Campeonato de Portugal; Vitória de Guimarães, Leixões, Beira-Mar e Estrela da Amadora, na Taça de Portugal. Com notas de rodapé: o Leixões (1960-61) bateu o FC Porto na final disputada nas Antas (2-0) e tornou-se o primeiro representante português na Taça das Taças – já agora, o FC Porto perdeu duas finais nas Antas, a outra contra o Benfica em 1982-83 -; Estrela da Amadora e Beira-Mar ganharam a equipas da sua laia, Farense (na altura na II Divisão) e Campo-maiorense; o Vitória de Guimarães cometeu a proeza de vencer o Benfica no único troféu conquistado (2012-13), mas já conta com cinco finais perdidas. 

Momentos tonitruantes, os das vitórias de Benfica sobre FC Porto por 6-2 (1963-64), Benfica sobre FC Porto por 5-0 (1952-53) e de Benfica sobre Sporting por 5-4 (1951-52), a final com mais golos da história da Taça de Portugal. Talvez, apesar de toda a magia da competição princesa que leva o nome do país às costas, não pudesse deixar de ter sido um Benfica-Sporting. Como um destino…