Recordo um diálogo comovente, e cheio de ternura, entre uma Mãe muito idosa, acamada, em sofrimento e prestes a partir, e um Filho dedicado, que a visitava todos os dias. Essas visitas eram muitas vezes acompanhadas por música clássica, que ambos ouviam em silêncio cúmplice, ou por uma canção com um poema simples, que o Filho cantava com um sorriso, enquanto tocava guitarra.
Recordando isto, vem-me à memória a resposta belíssima da Mãe, a propósito da morte que não a angustiava mas que apenas a preocupava. E por não ter mais um dia ou uma hora para fazer ou ver mais alguma coisa: um carinho, uma palavra amiga, uma flor ou um sorriso de criança… Porque, até ao fim, há sempre mais qualquer coisa…
Lembrando, ainda, Bento XVI, no encontro que teve no CCB com pessoas da cultura, o seu pedido foi fundamentalmente para fazermos das nossas vidas lugares de beleza, mas, também, de humanismo e solidariedade.
Numa ética que se quer verdadeiramente humana, não há lugar para a eutanásia.
Como diz Jorge de Sena, é preciso agradecer a «honra de estar vivo».
E não há, ainda, lugar para ideias erradas, e é preciso que tudo fique claro:
– Acabar com tratamentos excessivos e despropositados que deem lugar a vidas vegetativas não é eutanásia.
– Administrar tratamentos e analgésicos que aliviem o sofrimento e a dor, mesmo que isso implique menos tempo de vida, não é eutanásia. Antes deveria ser prioritário generalizar a todo o país os cuidados paliativos, em nome do respeito pela pessoa e pela sua dignidade.
– A eutanásia é diferente: é uma ação ou omissão que acaba com o sofrimento mas que também causa a morte. Eufemisticamente, fala-se em «morte clinicamente assistida» ou em liberdade de morrer. Mas, na verdade, do que se trata é que um técnico de saúde (enfermeiro ou médico) mate alguém ou que para isso contribua – situação esta que o Estado se propõe legalizar (contrariando o Artigo 24.º da Constituição da República Portuguesa, que diz que «a vida humana é inviolável»).
– Diferente é o suicídio: alguém que, em grande sofrimento, põe termo à sua própria vida. Ninguém tem o direito de atirar a primeira pedra, mas, antes, com um amor fraterno, tentar compreender a situação de desespero e de dor. Como diz a doutrina cristã: condenar o pecado mas amar o pecador. E, que nunca mais aconteçam situações do passado, de gritante incompreensão e profunda desumanidade, de recusar um funeral com dignidade a alguém que se suicidou.
Eugénio de Andrade diz que «É urgente o amor, é urgente permanecer». E que bênção seria – o que tragicamente não acontece, tantas vezes – se a morte chegasse num tempo sereno, de carinho e de paz, com os que mais amamos à nossa volta.