Muro de Trump vai a votos

Presidente dos EUA voltou atrás na separação das famílias imigrantes, mas a ordem executiva é omissa sobre o futuro das 2300 crianças detidas

A assinatura de uma ordem executiva pelo presidente Donald Trump para acabar com a separação de crianças migrantes das suas famílias foi recebida com alívio por muitos imigrantes sem documentos. Mas o fim desta prática, que muitos acusaram de ser “cruel” e “desumana”, enfrenta agora obstáculos legais e, sobretudo, práticos. A aplicação da política de “tolerância zero” em relação aos imigrantes levou à detenção de mais de 2300 crianças nas últimas cinco semanas, entre elas encontrando-se bebés. Para as albergar, o governo norte-americano construiu três campos de tendas no sul do Texas.

Um dos primeiros obstáculos ao fim da separação das famílias é uma ordem judicial, de 1997, que impede a detenção de famílias por mais de 20 dias – um obstáculo que contraria a vontade da administração de as deter indefinidamente até os migrantes maiores de idade – pais, mães e irmãos – serem julgados e, porventura, deportados para os seus países de origem. É precisamente uma das acusações que os democratas e organizações de direitos humanos têm dirigido à mais recente decisão de Trump. 

Nas suas quatro páginas, a ordem executiva reafirma a política de “tolerância zero” de Trump, criminalizando todas as pessoas que passem a fronteira ilegalmente, ao mesmo tempo que estipula a criação de instalações de detenção que permitam às famílias continuarem juntas, não referindo o que lhes acontecerá enquanto as instalações são construídas. Sobre as 2300 crianças detidas no Texas, o documento é omisso.

Entre declarações de porta-vozes e diretores de comunicação da Administração para as Crianças e Famílias, a confusão parece imperar. Uns dizem que os menores entretanto detidos serão entregues às famílias, enquanto outros afirmam que ainda é cedo para especular. No entanto, um dos representantes da agência federal deixou em aberto a possibilidade de as crianças serem entregues a membros da família que não os pais ou mesmo a famílias de acolhimento que vivam nos Estados Unidos, segundo o “New York Times”.

Novas leis Enquanto as crianças continuam detidas, os jogos políticos nos corredores de Washington não param. Sob pressão das críticas, Trump voltou atrás no que ainda há uns dias defendia com unhas e dentes, afirmando categoricamente que “não se pode fazê-lo [reverter as separações] por meio de uma ordem executiva”. O recuo, apoiado pelo chefe de gabinete, John F. Kelly, não teve apenas como motivação silenciar os críticos, mas também aliviar a pressão política sobre a secretária da Segurança Interna, Kirstjen Nielsen, uma das principais defensoras da política da administração e protegida de Kelly. 

Na quarta-feira à noite, Nielsen foi obrigada a abandonar um restaurante mexicano quando membros do partido Socialistas Democratas da América (DSA na sigla em inglês) lhe gritaram “vergonha” e “parem com a separação das famílias”. Os ânimos parecem estar em escalada na sociedade americana, profundamente dividida desde que Trump ganhou as eleições presidenciais. 

Numa reunião à porta fechada no Capitólio, Trump reafirmou aos republicanos que os apoia a “1000%” nos esforços de reformar a política de imigração. Os congressistas republicanos expressaram receios pela separação das famílias, mas Trump seguiu o guião de sempre: culpou os democratas. Depois apelou aos republicanos para avançarem com leis que permitam às famílias permanecerem juntas. “O presidente quer que isto acabe”, disse Carlos Curbelo, congressista republicano pela Florida, depois do encontro. Por sua vez, Trump limitou-se a dizer que a “reunião foi excelente”. 

À saída, Trump foi interpelado nos corredores do Congresso por congressistas. Um deles foi Juan Vargas, da Califórnia, que gritou: “Não tem filhos, senhor presidente? Como se sentiria se o separassem deles?” 

A Câmara dos Representantes deverá votar agora um conjunto de projetos legislativos sobre imigração, resultado de um consenso entre congressistas conservadores e moderados. Nas propostas encontra-se incluído o financiamento para a construção do muro na fronteira com o México e um plano para os dreamers – jovens com menos de 16 anos que entraram ilegalmente nos EUA – obterem a cidadania norte-americana.

“Esta é uma proposta consensual. É uma proposta que pode vir a tornar-se lei”, disse Kevin McCarthy, líder dos republicanos no Congresso, à Associated Press. No entanto, a esperança pode ser exagerada por permanecerem dúvidas sobre a aprovação das propostas, uma vez que muitos democratas se opõem à construção do muro.