Deixem a Madonna em paz

As cidades querem visibilidade e investem muito nisso. Não são parques para 15 automóveis – são milhões de euros de isenções fiscais

Chamem-me provinciana, chamem-me o que quiserem, mas eu adoro a Madonna e adoro que viva em Portugal, que viva em Lisboa. Face à polémica, hoje é dia de defender Fernando Medina.

Vamos por partes. 

As receitas da Câmara provêm dos terrenos e prédios que vende, e dos nossos impostos e taxas – que, neste momento, são sobretudo o IMT, ou seja, o imposto que arrecada pelos imóveis que são vendidos na cidade de Lisboa. Quanto mais os particulares compram e vendem apartamentos e casas, mais a Câmara enche os cofres.

Com o dinheiro que tem, a Câmara faz muitas coisas. Também envia para as juntas de freguesia umas centenas de milhões de euros, para que estas façam outras tantas. 

Do orçamento da Câmara saem todos os anos muitos milhões de euros para organizações, clubes desportivos, associações recreativas ou culturais, igrejas, etc. Para dar exemplos que, pela sua diversidade, não ofendam ninguém, refira-se que a Câmara apoia com o nosso dinheiro a Fundação Mário Soares ou o Arraial Pride Gay, e ainda contribui para fazer obras em igrejas ou para organizar torneios desportivos.

Toda a gente se senta à mesa do orçamento camarário. Nas escolhas que a Câmara faz, muitas são para satisfazer clientelas políticas, grupos de influência e lobbies – que ninguém duvide. Aliás, é por isso que se torna difícil mudar os presidentes de Câmara: dão tantos subsídios a tanta gente durante tanto tempo que é muito fácil manterem o poder. A limitação de mandatos é, portanto, absolutamente fundamental e democrática. 

Para além disto, a Câmara de Lisboa tem de concorrer com outras cidades do mundo por eventos que façam publicidade ao país ou que sejam geradores de emprego na cidade.

Veja-se dois casos recentes: a realização da Web Summit em Lisboa por três anos consecutivos ou a vinda da sede do Império ismaelita / Fundação Aga Khan para o palacete Ventura Terra (em frente do El Corte Inglès). 

É um autêntico leilão: as cidades disputam esses eventos ou as sedes de instituições internacionais oferecendo as melhores condições. E não são parques para quinze automóveis – são milhões de euros em isenções fiscais.

Elaboram-se contratos de centenas de páginas, feitos por bons advogados, no silêncio dos gabinetes, ninguém vê nada, ninguém sabe de nada. E isto acontece todos os dias na cidade. 

Com a Madonna foi às claras. Medina foi visitá-la ao Ritz em maio do ano passado. Terão falado, ela não pediu milhões de euros em isenções. Veio mesmo viver para Lisboa, não fez de conta, tem os miúdos a frequentar a escola e um filho a jogar no Benfica. Tem uma frota de 15 automóveis e precisava de sítio para os estacionar. Não pediu muito. Em todas as reuniões de Câmara o vereador José Sá Fernandes e o vereador Ricardo Robles dão milhares de euros para as coisas mais tontas que se possam imaginar. 

Portanto, não se façam de virgens ofendidas e deixem a Madonna em paz.