Promotores do hotel do Rato cumpriram todas as regras

Ministério Público não se conforma com obra ao lado da PGR e da sinagoga, mas promotores do projeto de Aires Mateus e Valsassina dizem que até já têm pré-acordo com comunidade judaica. Se CML travar projeto, vai ter de pagar indemnização.

Promotores do hotel do Rato cumpriram todas as regras

O ‘Mono do Rato’ continua parado e envolvido em polémica. Depois de o Ministério Público (MP) ter defendido que a construção deste edifício violava até a Constituição portuguesa, fonte ligada ao projeto garantiu ao SOL que foram cumpridas todas as regras no que diz respeito à aprovação e licenciamento de construção daquele que poderá vir a ser o novo hotel do Rato.  O SOL sabe que, apesar de terem sido pagas licenças de construção para apartamentos, os responsáveis  pela empreitada mudaram de ideias no ano passado, querendo afinal transformar o prédio num hotel. Caso a obra não arranque, a promotora do projeto está preparada para avançar para os tribunais e exigir uma indemnização à Câmara.

O historial do projeto – criado pelos arquitetos Frederico Valsassina e Manuel Aires Mateus e aprovado em 2005, quando a Câmara Municipal de Lisboa era liderada por Pedro Santana Lopes – já deu muitas voltas. O projeto parecia ter luz verde em 2010, já com António Costa à frente da autarquia. No entanto, oito anos depois, com Fernando Medina presidente da CML, voltam a ouvir-se muitas vozes contra a construção deste prédio, junto ao edifício da Procuradoria-Geral da República e da sinagoga. O caso levou mesmo a que o MP avançasse, no final de maio, com uma ação  no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, com o objetivo de colocar um travão no arranque das obras.

Atentado à liberdade religiosa?

Um dos argumentos usados pelo MP para pedir a nulidade do projeto está relacionado com a liberdade religiosa – o procurador responsável por este caso alega que a construção iria «enclausurar» a sinagoga de Lisboa, escondendo-a e afastando-a da população. No entanto, segundo o SOL apurou, os entraves à construção não foram colocados pela sinagoga. Fonte ligada ao projeto  revelou ao SOL que a promotora da obra e a comunidade judaica chegaram mesmo a um pré-acordo. No entanto, a sinagoga fez uma exigência: o prédio não poderá ter janelas na parte de trás – que tem vista para o templo judaico – por forma a proteger os crentes que frequentam aquele espaço religioso. Assim, a argumentação do MP, para os promotores, cai por terra.

Também a Câmara Municipal de Lisboa se opõe a esta ideia: a autarquia entregou uma contestação no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, na qual, entre outros pontos, defende que o projeto não interfere com a liberdade religiosa de cada um. 

«Ao contrário do que é alegado, concluiu-se que o edifício a construir não enclausura a sinagoga, dando-lhe sim maior abertura e visibilidade», alega a Câmara de Lisboa, dizendo até que, em 2005, um parecer técnico referiu que a construção iria permitir «a integração da sinagoga de Lisboa na frente Urbana em causa», refere a contestação, a que o SOL teve acesso. 

«Nos procedimentos de licenciamento cumpre aferir se a obra projetada cumpre os requisitos urbanísticos em vigor, não cabendo fazer juízo de valor (…) Não se entende e repudia-se a afirmação do MP quando insinua que se está com este processo a praticar atos de discriminação religiosa», acrescenta a autarquia na mesma peça processual.

‘Um dos melhores projetos’ a nível mundial

Mas não foi só a questão religiosa que levou o MP a pedir a nulidade do projeto: também aspetos técnicos da construção serviram para argumentar contra a edificação do ‘Mono do Rato’ – o material utilizado, a dimensão do edifício e a sua localização são questões apontadas pelo MP como características que ‘quebram’ a paisagem e o ambiente do Largo do Rato. 

No entanto, fonte ligada ao projeto afastou essa ideia, garantindo que este é «um dos melhores projetos arquitetónicos a nível mundial» e que a maquete do projeto foi «bastante elogiada» a nível internacional. A mesma fonte disse ao SOL  que, se chegar a ser construído, este edifício não irá violar a paisagem envolvente, que será uma mais valia para a zona e irá tornar-se «num dos edifícios mais fotografados em Lisboa», à semelhança do que se passou com a Casa da Música no Porto, que quando foi construída também foi muito critica e agora é uma das obras mais contempladas na Invicta.

A Câmara de Lisboa também defende que a construção não terá qualquer impacto a nível paisagístico – a autarquia diz mesmo que o Largo do Rato já está repleto de edifícios de diferentes épocas e que apenas aquele gaveto continua ‘à espera’ de um projeto inovador: «Basta uma deslocação ao local para se constatar que o gaveto em causa é o único do Largo do Rato que se encontra por rematar, representando o projeto apresentado uma mais-valia decorrente da substituição do edificado existente por uma intervenção contemporânea».

«O Largo do Rato tem vindo a ser rematado ao longo de décadas com novas edificações, surgindo no presente como um conjunto heterogéneo caracterizado por várias edificações, cada uma delas marcando a sua época e fazendo uso de uma linguagem arquitetónica contemporânea. Foi assim com a sede do Partido Socialista e também com o edifício dos CTT, nos anos 40. Não choca por isso que, do ponto de vista estético, se possa deixar uma marca do século XXI numa das extremidades do Largo do Rato», refere a contestação, consultada pelo SOL. 

Quanto aos aspetos ambientais, a autarquia defende que pareceres realizados por especialistas mostram que a construção não coloca em causa a envolvência daquela artéria da cidade: «O projeto licenciado cumpre à risca as regras relativas à cércea [Designação do limite da altura de um edifício]» e «não só não agrava a salubridade dos logradouros confinantes como inclusive poderá melhorar a situação existente, por força da redução da costa de cobertura do estacionamento».

As licenças de construção do edifício foram pagas há cerca de dois anos, disse ao SOL fonte ligada ao projeto. Mas o que acontece se o ‘Mono do Rato’ não avançar? Segundo o SOL apurou, a promotora do projeto irá avançar com uma ação judicial, exigindo uma indemnização de mihões de euros.