Buraco Negro: O contributo português para a história

Esta semana a ciência falou mais alto e a primeira fotografia de um buraco negro foi revelada. O SOL falou com o português que ajudou a fazer história.

Buraco Negro: O contributo português para a história

A publicação da primeira fotografia de um buraco negro é um acontecimento que ficará para a história. E no meio da ciência e do maior projeto de astronomia do mundo há  um português – chama-se Hugo Messias e trabalha no observatório ALMA, no Chile. 

Ao SOL contou que a paixão por tudo aquilo que está fora da terra não se revelou desde criança e confessou que no ensino secundário juntou a arte e a física e que isso resultou na escolha do curso de Física da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. «Efetivamente pode ter ajudado o facto de os meus pais me terem comprado um telescópio em criança e, na primeira noite que observei através do telescópio… vi Júpiter, vi Saturno, vi tudo e mais alguma coisa, aquilo foi um espetáculo», recorda Hugo Messias, enquanto fala da noite «de céu bem limpo» em casa dos avós.

Hugo deu um salto de gigante da licenciatura até ao ALMA, um dos oito observatórios que estiveram envolvidos na primeira observação de um buraco negro. Pelo meio fez o doutoramento e nos últimos anos trabalhou – dividido entre o trabalho de investigação em Santiago e as observações no ALMA, a cinco mil metros de altitude – para o resultado divulgado esta quinta-feira: a imagem do tão aguardado buraco negro, que prova que, afinal, Albert Einstein tinha razão e a Teoria da Relatividade funciona. «A imagem é como é, não há volta a dar – é um anel e tem uma parte mais brilhante», diz o português nascido em Lisboa. É um avanço «espetacular», mas ainda há muito trabalho para fazer. Agora «é preciso fazer uma monitorização temporal para ver como é que essa morfologia muda ao longo do tempo e com isso conseguem testar-se os cenários que foram considerados e começar a descartar até se perceber o que é que se está a passar à volta de um buraco negro». Há perguntas às quais é necessário dar resposta e, segundo Hugo Messias, uma das mais importantes será perceber «a criação dos jatos [de partículas, que se acredita que sejam produzidos pelos buracos negros], porque dão origem a coisas impressionantes e muito maiores do que o tamanho da própria galáxia». 

O buraco negro foi fotografado na Galáxia M87, mas este fenómeno não é, de todo, impossível de captar na Via Láctea, a galáxia onde gira o planeta Terra – poderá até ser a próxima publicação da equipa. No entanto, não é matéria simples e o trabalho de captação da imagem é, provavelmente, ‘astronómico’. Para explicar, ninguém melhor do que um astrónomo: «O buraco negro da nossa galáxia, apesar de estar mais perto, é mais pequeno. E por ser mais pequeno, o material que está à roda dele vai fazer uma órbita muito mais rápido». A órbita pode demorar até meia hora, «o que significa que em menos de meia hora a morfologia vai mudar, portanto é quase como conseguir fazer um vídeo a cada minuto». O sistema ainda não permite fazer isso, mas Hugo Messias conta que já há pessoas «a pensar em maneiras alternativas para corrigir isso». 

 

A ciência do tempo e o que os outros pensam dela 

A colaborar com o ALMA, o português que pratica judo e joga futebol com amigos portugueses ao domingo em Santiago tem outros sonhos: «Ver a curvatura da terra ou ser astronauta» paira sempre nos seus pensamentos. Para já, Hugo não tem dúvidas da importância que a astronomia e a fotografia que prova a existência de um buraco negro têm para a sociedade. «De certa maneira, não é óbvia a contribuição da astronomia para a sociedade, porque pode não ter implicações no imediato, mas a longo prazo vai ter», garante.

E dá o exemplo: usar o GPS já faz parte da rotina quando se viaja, no entanto, o processo para poder pegar no telemóvel e ter um trajeto desenhado no mapa não foi imediato. E aqui entra a astronomia. «Para o GPS ter a precisão que tem, é preciso ter em conta a teoria da relatividade». Então, explica Hugo Messias, «se esta tecnologia está certa, é possível adotá-la e fazer outras coisas espetaculares para a sociedade». 

A astronomia não tem limites, nem mesmo o céu e consegue espalhar-se por todas as áreas. O GPS é um exemplo claro, mas a área da Saúde também beneficia destas descobertas. O português do ALMA falou do James Webb Space Telescope, um telescópio que ainda não foi lançado. «Trata-se de um sistema que permite que o espelho do telescópio esteja perfeitamente liso», conta, adiantando que essa tecnologia foi já adaptada ao estudo dos olhos. «O telescópio ainda nem foi para o espaço e a tecnologia que foi usada para o calibrar, para o desenvolver, já está a ser usada para tratamento dos olhos», disse, acrescentando: «Isso é espetacular». 

Um professor chegou a apelidar Hugo de turista. Não passava muito tempo na faculdade, gostava de descarregar energia no judo, mas isso não o desviou do sonho: ser astrónomo.