Bancos unem-se contra Joe Berardo

Empresário madeirense deve quase mil milhões de euros ao Novo Banco, Millenium BCP e Caixa Geral de Depósitos. Em 2007 era o quinto homem mais rico do país.

Vai ser uma batalha inédita de três contra um: pela primeira vez, Novo Banco, Millenium BCP e Caixa Geral de Depósitos (CGD) uniram-se para avançarem com uma ação judicial contra Joe Berardo. Em causa estão dívidas do empresário madeirense aos três bancos, no valor de 962 milhões de euros, contraída para comprar ações do Millenium BCP.

De acordo com os dados divulgados no portal Citius, o processo deu entrada no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa no passado dia 20. Na ação, são visadas também a Fundação José Berardo, a Metalgest e a Moagens Associadas. 

A decisão de avançar para os tribunais surgiu depois de Joe Berardo ter recusado o acordo proposto pelos bancos, que tinha como foco a Fundação Berardo e a coleção de obras de arte. Agora, a defesa dos bancos tentará executar o antigo investidor e especulador da bolsa. Na altura, Berardo deu como garantia as próprias açõe do BCP e a sua coleção de arte. No entanto, existem dúvidas quanto à possibilidade de poder penhorar as obras – segundo o Correio da Manhã, o empresário tem em seu nome apenas uma garagem na Madeira. Em 2006, a leiloeira Christie’s avaliou a coleção de arte de Berardo num valor que ascende a 316 milhões de euros.

O SOL colocou questões aos três bancos em relação ao valor da dívida que Berardo deve especificamente a cada uma das instituições financeiras, às garantias – além das ações do BCP – que foram concedidas para o empréstimo e às expectativas em relação à penhora de bens, mas, até ao fecho desta edição, não obteve respostas nem do Novo Banco, nem da Caixa Geral de Depósitos. O Millenium BCP respondeu apenas que não iria fazer qualquer comentário em relação a este assunto.

Guerra no BCP

«Os bancos é que vieram oferecer-me crédito para comprar ações», garantiu Joe Berardo, numa entrevista ao Diário Económico, em 2011. Em 2007, o Banco Espírito Santos (BES, atual Novo Banco), CGD e BCP emprestaram quase mil milhões de euros ao empresário para investir nas ações do Millenium. 

Berardo estava do lado dos grandes acionistas – como Manuel Fino e Teixeira Duarte – na guerra contra Jardim Gonçalves, que na altura liderava o banco. Esta guerra acabou com a queda do fundador do banco privado, que foi substituído por Paulo Teixeira Pinto. 

Com o colapso durante a guerra interna do banco, as ações do BCP andavam nos quatro euros, mas em 2009 já valiam apenas 0,80 euros. Atualmente valem apenas 0,24 euros. Com a queda dos valores das ações, a fortuna de Berardo – que, em 2007 chegou a ser o quinto homem mais rico do país, com um património avaliado em 890 milhões de euros – perdeu um terço do valor em apenas alguns meses.

Devedores da Caixa

O nome de Joe Berardo também está associado à última polémica com a CGD. No início do ano, foi revelada a lista com os maiores devedores do banco público – o nome do investidor aparecia na lista.

Segundo a auditoria da EY à gestão da Caixa, na listas das 25 maiores operações que geraram perdas para o banco aparecem empresas ligadas a Berardo: a auditoria identificou um crédito de 350 milhões de euros concedido ao empresário e um outro de 50 milhões à Metalgest. Em 2015, o dinheiro emprestado pela Caixa a Berardo era 268 milhões de euros, mais os 53 milhões para a Metalgest.

Berardo será ouvido no dia 7 de maio na segunda comissão de inquérito à recapitalização e gestão da CGD para esclarecer a forma como estes créditos foram atribuídos. No início do mês, o antigo presidente do Conselho Fiscal da Caixa, Eduardo Paz Ferreira, revelou que era dado um «tratamento especial à margem das regras» a alguns devedores, sobretudo ao comendador. 

No entanto, na quarta-feira, o ex-diretor de grandes empresas da CGD, José Pedro Cabral dos Santos, assegurou que Joe Berardo não teve tratamento privilegiado. «Que eu conheça, a Metalgest e a Fundação José Berardo nunca tiveram qualquer tipo de privilégio de tratamento na Caixa, muito menos um tratamento à margem das regras», afirmou. Ainda assim, Cabral dos Santos admite que «dada a relevância dos problemas ligados às operações, obviamente que o cliente José Berardo teve sempre um tratamento de grande atenção, de grande cuidado e de grande proximidade».