Eventos Digitais: Agora Sim, o Mundo é Plano

Temos vivido na ilusão que o século XXI criou um mundo plano, onde um qualquer ser humano armado de um computador ou outro qualquer dispositivo digital teria igual força para impactar a Humanidade.

por Filipe Carrera
Coordenador da Pós-Graduação em Marketing Digital e do Programa Avançado em e-Commerce do IPAM

Em 2005, o jornalista Thomas Friedman publicou O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI, defendendo que a globalização e a tecnologia estavam a remover todas as barreiras geográficas no acesso aos mercados, à informação e ao conhecimento.

Mas qual aldeia gaulesa do Astérix, os eventos continuavam a resistir e a ter uma base geográfica, por razões de tradição, clima, densidade populacional, infraestrutura hoteleira ou outras.

Alguns eventos ensaiaram alguma transformação digital, com utilização de conectividade através de Bluetooth, apps ou conteúdos digitais associados a momentos anteriores e posteriores ao evento, estendendo deste modo a duração e o impacto do evento.

Até fevereiro de 2020 este foi um processo lento pela conjugação de três fatores: uma crença profunda dos organizadores de que nada substitui a interação humana, a fraca adesão dos destinatários e finalmente a dificuldade em rentabilizar o investimento na componente digital dos eventos.

Por estas razões, muitos destes investimentos foram vistos como forma de criar notícias acerca do evento e uma boa perceção do seu grau de inovação.

E tudo isto foi funcionando até que a covid-19 tudo mudou!

Aquilo que era estória para os filmes aconteceu, uma pandemia, mas ao contrário dos filmes, perto do final o herói não descobriu a vacina, e ficamos conscientes que o que aconteceu uma vez pode voltar a acontecer, uma segunda vaga, uma terceira ou um novo vírus.

De repente a humanidade descobriu que os vírus se propagam e que o mundo agora também é plano para eles.

Os organizadores de eventos descobriram que os seus eventos são muitos mais vulneráveis do que pensavam, que o trabalho de planeamento de meses, ou mesmo anos, pode ser destruído de um momento para o outro.

As empresas que enviam colaboradores para participar em eventos começam a fazer contas e verificar que, por exemplo, enviar um responsável da empresa para fazer uma intervenção de 15 minutos perante uma audiência de escassas centenas de pessoas pode gerar custos na casa dos milhares de euros, contra zero ou quase, quando feita a partir de um qualquer computador.

Há mais de 15 anos que faço os chamados webinars, mas desde março de 2020 tive uma autêntica explosão de solicitações e audiências de todo o mundo interessadas nas mais variadas plataformas, o que me leva a concluir que as audiências dos eventos estão a habituar-se a formatos digitais.

Atenção, não estou a dizer que os eventos vão ser agora todos virtuais.

Na minha visão, no futuro próximo não teremos mais eventos 100% presenciais, por várias razões:

• Os participantes (empresas e pessoas) terão menos recursos financeiros disponíveis, criando uma pressão para redução de custos e para a criação de opções digitais mais económicas, poupando pelo menos deslocações e alojamento.

• Os organizadores irão querer ter um plano de contingência para evitar os custos inerentes a um cancelamento total.

• As audiências ao serem mais conscientes das alternativas digitais, vão tornar-se mais exigentes na componente presencial, sendo que esta deve criar experiências únicas e de difícil transposição para o digital.

Um aviso à navegação, quem não apreender os sinais de mudança arrisca-se a extinguir-se.