Mohammed Al Maktoum. O xeque que terá feito das filhas reféns

O mundo surpreendeu-se ao ver Latifa, uma princesa do Dubai, contar como era mantida prisioneira pelo próprio pai. Mas os avisos não são de agora. Há quase vinte anos foi notícia que Al Maktoum mandara raptar a irmã mais velha de Latifa, Shamsa, numa rua de Cambridge, arrastando-a para um jato privado.

É difícil distinguir a história do Dubai, e dos Emirados Árabes Unido (EAU), da história dos Al Maktoum. Hoje, o patriarca da dinastia, o xeque Mohammed bin Rashid Al Maktoum, de 71 anos, gosta de se apresentar como um bilionário discreto, apaixonado por cavalos e aspirante a poeta, frequentador assíduo dos círculos da aristocracia britânica, a mente por trás do império aéreo emirati, do reluzente arranha-céus Burj Khalifa ou das megalómanas Palma Islands. Quem imaginaria que a pequena cidade portuária onde Mohammed cresceu, um protetorado britânico dedicado à apanha de pérolas, sem qualquer hospital, escola pública ou aeroporto, com uns meros vinte mil habitantes, se tornaria um epicentro do capitalismo? Contudo, para lá da opulenta fachada dos Al Maktoum, ouvimos cada vez mais relatos da brutalidade do vice-presidente da UAE e monarca do Dubai, de raptos, abusos e até tortura, contra mulheres da sua própria família.

Atualmente, o caso que faz manchetes é o de Latifa bint Mohammed Al Maktoum, filha do xeque do Dubai, com 35 anos, que conseguiu gravar um vídeo em segredo, contando estar refém numa vivenda transformada em prisão. As imagens chegaram às mãos da BBC, causando consternação. A ONU já prometeu investigar o caso, até o Reino Unido – que mantém extensas relações comerciais com o seu antigo protetorado, inclusive com vendas do armamento mais moderno – mostrou preocupação, e vários grupos de direitos humanos apelaram ao Presidente dos EUA, Joe Biden, que tome posição.

No entanto, os alertas para os abusos do xeque do Dubai já vêm desde 2001. Em dezembro desse ano, uma irmã mais velha de Latifa, Shamsa bint Mohammed al Maktoum, ligou para um advogado britânico, desesperada, temendo a raiva do seu pai, a quem tinha desagradado. Contou como fora raptada por quatro homens árabes, armados, à saída de um bar numa rua de Cambrige, após escapar da mansão da família. Foi arrastada para um jato privado, drogada e levada de volta ao Dubai, avançaram os media britânicos na altura. Hoje, Shamsa terá 39 anos – desde essa chamada, nunca mais foi vista em público, nem foi dada qualquer prova de vida.

É difícil imaginar o quão vulneráveis estariam Shamsa e Latifa aos abusos do seu pai. Aliás, até a sua ex-mulher, Haya Bint Al Hussein, que podia contar com o apoio do seu meio-irmão, o rei da Jordânia, foi intimidada pelo xeque do Dubai, apurou a justiça britânica, o ano passado. Haya, de 45 anos, uma campeã de hipismo que participou nos Jogos Olímpicos, era a sexta e mais jovem mulher do xeque. Até que o casamento deu para o torto, quando Haya começou a questionar o destino das suas enteadas, e se envolveu num caso com um guarda-costas britânico, que, entretanto, fugiu dos Emirados. Foi aí que começou uma campanha de perseguição, com armas colocadas na almofada da princesa, enquanto dormia, e ameaças que a levariam para uma prisão secreta no deserto. Haya escapou e está neste momento refugiada no Reino Unidas. Talvez um dia Shamsa e Latifa tenham a mesma sorte.