Oito pistas para compreender a obra de Julião Sarmento

Excertos de Sobre Julião Sarmento, coord. de Bruno Marques, Quetzal, 2012

‘Quero dizer que os fragmentos de Sarmento rejeitam as oposições radicais. Começam e acabam com a transgressão, como esse relâmpago que ilumina o céu por um instante apenas para nos revelar a escuridão que lhe é inerente’
Kevin Power

‘As instalações que envolvem fotografias e texto, as frequentes referências ao cinema, pinturas constituídas por vários painéis e desenhos, a ênfase dada à posição do corpo humano: todas estas obras mostram que estamos perante um artista que tem explorado coerentemente as relações com o espectador’
Michael Tarantino

‘O ‘espaço entre as coisas’ podia facilmente referir-se ao modo como o artista usa a pintura para estabelecer uma relação aberta com o observador. Como um manipulador de imagens, usa a montagem como chave para a recepção da obra. Paradoxalmente, esta recepção baseia-se na possibilidade de interpretar mal as imagens, de não aceitar a primeira impressão como definitiva’
Michael Tarantino

‘‘Só me interessa a minha vida pessoal’, disse-me ele. Julião Sarmento e eu estávamos num café a falar sobre a profusão de elementos autobiográficos que informa a sua obra. Tinha-me proporcionados uma leitura próxima e íntima das pessoas, lugares, eventos que servem como marcos históricos da sua vida e animam as suas obras, e com toda a franqueza reconhecera que a importância da vida pessoal era o tema central da sua arte. Embora muita coisa permanece obscura, a acumulação de referências sociais e sexuais, a abundância de obsessões e de fantasias destiladas no vocabulário rico em imagens pode, de facto, explicar as estruturas narrativas da sua pintura, mas apenas parcialmente’
Jan Avgikos

‘Fiquei cada vez mais interessado na essência daquilo que estava a fazer e não no aspecto físico ou do que estava à sua volta. Queria reduzi-lo ao mínimo, ao essencial… Comecei por eliminar tudo o que em princípio levaria a uma pintura… Tentei eliminar os pontos de atração porque não estava interessado neles. Queria que olhar das pessoas fosse capturado apenas pela essência do que ali estava. E o que ele estava era a forma mais simples possível, que iria traduzir e transmitir a ideia do que eu queria’
Julião Sarmento, em entrevista a Germano Celant

‘A obra de Julião Sarmento provoca duas sensações que se cruzam de uma forma indiscernível. Em primeiro lugar, uma sensação a que poderíamos chamar cinematográfica, resultado de um processo construtivo muito próximo dos processos de montagem cinematográficos. Em segundo lugar, a percepção de que o que vemos não se passa diante dos nossos olhos, mas é, pelo contrário, uma memória fugidia de alguma coisa que já vimos – pelo canto do olho’
Delfim Sardo

‘Se fosse necessário reduzir apenas a três os grandes núcleos de acção da sua obra, poderiam enunciar-se como correspondendo ao medo, ao desejo e ao sentido do mistério. Três grandes temas que a atravessam, conjugada ou solitariamente, e que enquadra, uma aproximação cada vez mais nítida aquilo que o grande poeta português Herberto Helder chamou o ofício de ver’
Bernardo Pinto de Almeida

‘No seu mundo de sombras, o desejo erótico e sensual contido nas suas pinturas é libertado em quadros semelhantes ao sonho cujas voluptuosas imagens de lábios, línguas, pernas e pele formam o lado diametralmente oposto à sua contenção gráfica ou das suas telas brancas impasto’
Chrissie Iles

 

Excertos de Sobre Julião
Sarmento, coord. de Bruno
Marques, Quetzal, 2012