Antes da apresentação do OE2022 houve um certo país político-jornalístico que ensaiou uma espécie de rejúbilo em alguns casos, mas perplexidade e estupefação na maior parte das vezes, com a opinião do antigo Presidente da República Cavaco Silva. Para a história não ficará nada sobre as ideias expressas, mas ninguém esquecerá a atitude, o estado de espírito e a forma arisca e descabida como Cavaco Silva, de quando em vez, surge, ele próprio, a realçar uma ideia, cada vez mais incontornável, de homem ressabiado, ressentido e rancoroso. É pena e é triste.
No preciso momento que está em discussão um orçamento que representa um novo impulso para a recuperação económica, vale a pena compreender a angústia de Cavaco. O OE2022 afirma uma marca de um modelo de desenvolvimento que mantém a tónica no aumento do rendimento, na consolidação da trajetória de aumento do investimento e no reforço dos serviços públicos, prosseguindo tudo isto com rigor orçamental. É no relançamento desta continuidade que Cavaco rabuja…
Se é verdade que o crescimento do país nos últimos 30 anos tem sido pouco expressivo, é irrefutável que a convergência com a UE desde 1992, com exceção de 1994, só convergiu com a UE ( i.e., cresceu acima da média da UE) com governos do PS. Mas mais significativo é que desde 2017, e durante três anos seguidos, Portugal cresceu mais que a média da UE, uma trajetória travada (apenas) pela crise pandémica em 2020, mas que será retomada em 2021, atingindo já em 2022 o nível de PIB que tinha no período pré-pandémico, como indicam todas as previsões. De resto, entre 2021 e 2022 o país deverá crescer quase 10%.
Estes resultados não agradam o antigo Presidente da República que leva-o a recuperar de forma despudorada o elogio às políticas troiquistas adotadas por Passos Coelho. Precisamente o período mais negro da economia portuguesa onde o combate a uma crise baseou-se na aplicação de austeridade em cima da austeridade, recusando, sem qualquer critério racional, as políticas anti cíclicas que ajudariam à recuperação económica e, dessa forma, ao controle do défice.
Nessa altura o PIB caiu menos do que a crise atual, mas demorou muitos anos a recuperar e o tecido económico sofreu uma profunda descapitalização que ainda não foi corrigida. Já o desemprego atingiu recordes na democracia portuguesa com quase 18% e o rendimento das famílias recuou muitos anos, com a pobreza a atingir valores inimagináveis.
Logo que a ‘geringonça’ em 2016 assumiu o comando das políticas públicas, recentrou a importância da devolução de rendimentos e da criação de condições para o investimento de forma a impulsionar o crescimento económico. Mas, ao mesmo tempo, fixou o controle do défice e a redução da dívida como fatores de credibilidade externa para suportar a atração de Investimento Direto Estrangeiro.
Esta abordagem permitiu financiar a economia quer pela via do investimento externo quer pela redução do custo da dívida. Assim os salários cresceram, as exportações tornaram-se competitivas ganhando quota de mercado, o investimento privado disparou e o diabo nunca apareceu. Pelo contrário, o peso da dívida no PIB caiu e o país atingiu um superávit.
Com a crise pandémica o governo seguiu o mesmo modelo mas advertiu a UE para a necessidade de apoios consistentes e solidários para combater a recessão decorrente da pandemia.
Por isso, o PRR é hoje a realidade que traduz uma visão mais realista das políticas públicas de combate à crise. Os 40 mil milhões decorrente do combate à pandemia têm uma contrapartida de dinheiro fresco sem penalizações na dívida.
Mas, o PRR é também o resultado do reconhecimento do falhanço dos governos que ‘viam diabos em todas as esquinas’ sempre que o salário mínimo aumentava ou as pensões eram devolvidas e, não menos grave, aumentavam colossalmente os impostas arrasando empresas e famílias e enfiando o país num círculo vicioso de empobrecimento. Foi isso que fez PSD e CDS e é isto que Cavaco sente saudades! Vai de retro Satanás.