The show must go on

Maria Antónia Palla trouxe a confirmação de uma boa nova: o fim da deriva ideológica anti-natura de António Costa 

1.Só muito recentemente perdi a inocência política. Qualidade (ou defeito) que os meus amigos mais politizados me criticavam desde o liceu.

Depois de 50 anos do mesmo, como esperar diferente? Pobres, pedintes, sempre mais atrás. As diferenças raríssimas que houve, engolidas pela regra geral, devem-se a gente rara de outra estirpe. Não a uma conquistada mudança de cultura, progresso acumulado, funcionamento novo das instituições, subida na exigência. A escola piorou sempre. Hoje assistimos à caricatura disso tudo. 

2. Um programa político a sério é uma estratégia, não é um catálogo. Não é este negócio a que assistimos para partilha do poder. Nem é, depois, navegação à vista para o manter. Quem pode esperar que agora vá ser diferente? Com os valores exangues, quantos se sentirão compelidos a agir de outro modo? E a Justiça, que só os pequenos e os fracos temem?

Graúdos e miúdos já se movimentam. Conhecemo-los. Preparam-se habilidades. Vêm aí os ‘programas’, toneladas de papel inútil, mais um ciclo de Portugal adiado. O circo anima-se, as luzes acendem-se.
‘Quem quer casar com a Carochinha, que é rica e bonitinha?’ 

3. Foi a RTP a abrir a festa. Para cumprir a agenda e arrumar André Ventura (iludem-se), lá veio a ‘entrevista’ a chispar ódio por um senhor de serviço às encomendas. Deve-se fingir que não se vê e não se ouve? E a sanha nem lhes deixa ver o óbvio: com ajudas assim nas televisões – e ainda faltam SIC, TVI e CNN – nem precisará de fazer campanha para se aproximar dos 15%.

4. Noutra entrevista, essa a sério, no Nascer do Sol, Ventura exibiu a arte que também domina de ganhar votos sem dizer nada. Arte que raramente pratica, note-se, pois não lhe falta que dizer. «Nem Salazar foi tão mau como se diz, nem Soares tão bom como se pensa», avançou. Ou seja: nem Soares foi tão mau como se diz, nem Salazar tão bom como se pensa. Só que dizer isto ou nada é o mesmo: ninguém é tão mau como se diz ou tão bom como se pensa.

Mas a habilidade semântica esqueceu um pressuposto determinante: comparou o incomparável – um ditador e um democrata. Ora, a democracia é sempre melhor do que a ditadura. No mínimo, esta apenas adia o problema. Portanto, Salazar seria sempre pior do que Soares, Soares melhor do que Salazar. (E, sendo humano, Soares era boa pessoa e Salazar não era.) E não continuaremos nós a pagar um percurso de ditaduras, de que a última foi a mais longa? E estaremos a vencer hoje esse passado? 

Mas AV acertou noutra tautologia: «Se fosse líder do PSD, teria maioria absoluta nas legislativas», disse. Mesmo sem precisar das tais entrevistas a chispar ódio nas televisões, insisto. E quando perceberão que o divertem? Começam a divertir-nos também a nós.

5. A recém-chegada CNN trouxe-nos Maria Antónia Palla, figura de referência do jornalismo e da resistência ao salazarismo. A dialogar com Sérgio Sousa Pinto, Sebastião Bugalho e Paulo Magalhães sobre as eleições no PSD, manifestou-se vibrante na apreciação pessoal e política de Rui Rio, que admira há muito. «Era já um democrata antes do 25 de Abril», garantiu. «Fiquei, muito satisfeita com a vitória dele nas eleições internas. Telefonei a uma grande amiga fundadora do PSD a dar-lhe os parabéns. E até lhe disse: ‘Ganhámos!’».

Na análise que já fizera antes sobre as legislativas, confirmou a democrata que terá sido sempre, como lembrou SSP e nem era preciso: «O partido que tenha mais votos deve governar e o seguinte na votação deve apoiá-lo»! Belisquei-me: em que país estava?

6. MAP trouxe, afinal, a confirmação de uma boa nova: o fim da deriva ideológica anti-natura de António Costa, o regresso do PS ao seu lugar natural, esteio da democracia liberal, das liberdades. Do ‘tudo com a extrema-esquerda iliberal’, vamos passar ao ‘tudo com os partidos da direita liberal’. 

Mantém-se em reserva o Delfim, e se correr mal… The show must go on.