Incêndios. Portugal nas mãos do clima e dos pirómanos

Mesmo quando as temperaturas baixam, os incêndios continuam a consumir milhares de hectares. O que se passa? O aumento do número de incendiários pode ser uma das respostas.

As semanas vão passando, mas os incêndios não acabam na Península Ibérica. Com mais ou menos calor, mais ou menos precipitação, a tragédia continua. No caso de Portugal, ao início da manhã desta sexta-feira não havia qualquer incêndio, mas a realidade rapidamente mudou  e tornou-se novamente negra.

O que não foi de estranhar, pois o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) colocara ontem mais de 50 concelhos dos distritos de Braga, Vila Real, Bragança, Guarda, Viseu, Coimbra e Castelo Branco em perigo máximo de incêndio rural, assim como vários concelhos de Viana do Castelo, Braga, Porto, Aveiro, Vila Real, Bragança, Viseu, Coimbra, Leiria, Castelo Branco, Guarda, Santarém, Portalegre, Lisboa, Beja e Faro em perigo muito elevado e elevado de incêndio rural. E este perigo vai manter-se elevado em algumas regiões do continente pelo menos até terça-feira.

«A todas e a todos é devida uma palavra de homenagem, de solidariedade, de apoio, às forças e serviços que integram o dispositivo nacional de Proteção Civil», afirmou o ministro da Administração Interna, que discursava em Portalegre, no âmbito da cerimónia de Compromisso de Honra de 291 novos militares pertencentes ao 47.º Curso de Formação de Guardas da GNR.

«Por todo o país [autarcas e comunidades] têm feito face e enfrentado estes desafios dos incêndios florestais cada vez mais exigentes e mais complexos para nós, em Portugal, mas para o conjunto dos países da União Europeia», disse José Luís Carneiro, fazendo questão de realçar que a GNR e os bombeiros têm um papel essencial no combate aos incêndios, na medida em que «dão o melhor de si» para defender a fauna, a flora e os seres humanos.

Exemplificando, à hora de fecho desta edição, Oliveira de Azeméis, Albergaria e Águeda sofriam com o fogo, segundo informação disponibilizada no portal da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC). Sabia-se que um incêndio que lavrava em Fial, no concelho de Albergaria-A-Velha, desde as 16h, estava a ser combatido, pelas 17h30, por mais de sete dezenas de operacionais com quase vinte meios terrestres e dois meios aéreos. Felizmente, o fogo encontrava-se em resolução.

No entanto, pouco antes das 17h, mais a norte, em Palmaz, já no concelho de Oliveira de Azeméis, os bombeiros ficaram em alerta novamente. Depressa se deslocaram para o local aproximadamente 50 operacionais com uma dezena de viaturas e um meio aéreo que, no espaço de somente 45 minutos, conseguiram que o incêndio começasse a ficar em estado de resolução. 

Volvidos 16 minutos, em Águeda, um fogo florestal consumia a Giesteira e era enfrentado por duas dezenas de bombeiros com cinco viaturas, estando também em fase de conclusão pelas 18h30 de ontem.

Devido ao panorama negro que se continuou a viver nesta semana, a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, anunciou, na quinta-feira, na habitual conferência de imprensa a seguir  à reunião do Conselho de Ministros, que o Governo decretara situação de calamidade no Parque Natural da Serra da Estrela durante um período de um ano, devido às consequências dos incêndios do mês corrente.

«Foi aprovada a resolução que declara a situação de calamidade no Parque Natural da Serra da Estrela por um período de um ano, em consequência dos danos causados pelos incêndios florestais registados em agosto de 2022, para efeitos de reposição da normalidade na respetiva área geográfica, salvaguardando a paisagem classificada do Estrela Geopark Mundial da UNESCO», lê-se no comunicado do Conselho de Ministros, sendo que no mesmo documento era referido ainda que será realizado «um procedimento de inventariação, no prazo de 15 dias, dos danos e prejuízos provocados pelos incêndios florestais registados (…), bem como em todos concelhos com área ardida igual ou superior a 4 500ha ou a 10% da respetiva área, em 2022».

Número de incendiários a crescer
Esta situação deve-se não só à meteorologia como aos incendiários. Como o i noticiou, na passada quarta-feira, entre o início do ano e o dia 21 de agosto, a Polícia de Segurança Pública (PSP) e a Guarda Nacional Republicana (GNR) detiveram, em conjunto, 69 incendiários. Ainda assim, este número já era superior há 12 dias, quando o Ministério da Administração Interna (MAI) mencionou que tinham sido detidos 119 suspeitos do crime de incêndio florestal.
«No período de tempo indicado, a Polícia de Segurança Pública (PSP), quer na sequência das inúmeras ações de vigilância, quer na sequência de denúncias, durante o presente ano, deteve 1 cidadão pelo crime de incêndio/fogo posto em floresta, mata, arvoredo ou seara», confirmou a PSP, enquanto a GNR apontou a detenção de 68 pessoas no ano corrente. 

Mas é necessário olharmos para os últimos cinco anos e analisarmos os dados dos períodos homólogos. Por exemplo, segundo a GNR, em números enviados ao mesmo jornal i, em 2021, por esta altura, tinham sido detidos 34 incendiários, 36 em 2020, 45 em 2019, 83 em 2018 e 31 em 2017. Já a PSP, por seu lado, indica quatro em 2021, seis em 2020, quatro em 2019 e sete em 2018.

A 14 de agosto, José Luís Carneiro fazia o seguinte ponto da situação: «Tínhamos 119 detidos, quer pela Guarda Nacional Republicana, quer pela Polícia Judiciária», declarou na Batalha (Leiria), no final da sessão solene do Dia do Município, acrescentando que outras «investigações estão em curso, para detetar as causas de outros incêndios, e poderão vir a culminar noutras detenções».

Segundo clarificou o ministro, o Executivo este ano reforçou muito «os mecanismos de fiscalização e de vigilância» e «esse trabalho de fiscalização e de inspeção» foi intensificado «numa articulação da Guarda Nacional Republicana com a própria Força Aérea, com vigilância aérea articulada com os 230 postos de vigia fixos e, depois, também a própria videovigilância que está colocada para serviço à floresta».

O governante adiantou igualmente que este ano há «uma taxa de detenção que está já muito mais acima do dobro daquilo que foi a taxa de detenção nos anos anteriores», o que «mostra também a eficácia do sistema no combate aos incendiários».