MEO Kalorama. Já nasceu o mais recente festival de verão em Portugal

O primeiro dia do MEO Kalorama viu os The Chemical Brothers infetar todos os festivaleiros com o ‘bichinho da dança’. Kraftwerk fez as delícias na eletrónica e Years and Years regressaram. 

O primeiro dia do MEO Kalorama, o mais ‘novo’ festival de verão a invadir a capital portuguesa, e o último do verão, teve um pouco de tudo: a melodia harmónica e etérea de Rodrigo Leão, o folclore-eletrónico colombiano de Bomba Estéreo e os hinos eletrónicos eternos dos britânicos The Chemical Brothers e também dos alemães Kraftwerk e Moderat.

Dançou-se, cantou-se e vibrou-se ao som, principalmente, da eletrónica que emanou dos diferentes palcos do novo festival, cujo primeiro dia foi feito de altos e baixos, fechando ainda assim com 'chave de ouro' no palco principal com uma atuação dos The Chemical Brothers que pareceu saída de outro mundo. O mesmo se pode dizer dos veteranos Kraftwerk que, no entanto, sofreram com problemas de som que retiraram alguma qualidade ao concerto.

RELATO

Ao chegar ao Parque da Bela Vista, onde decorre até sábado a primeira edição do festival MEO Kalorama, não é difícil perceber que esta ‘festa’ acaba de nascer: os festivaleiros ainda parecem baratas tontas à procura das entradas certas para o seu tipo de bilhete, ou dos palcos… a sinalização nem sempre é suficiente e os próprios elementos do staff estão ainda a conhecer os cantos à casa.

A comparação com o Rock in Rio é praticamente imediata. Afinal, os dois festivais partilham o mesmo espaço… mas pouco mais. Afinal de contas, o Kalorama é ainda um bebé e ocupa apenas uma parte do recinto, notando-se a presença de muito menos 'barracas' e contentores carregados de publicidades de bebidas energéticas ou alcoólicas, comparativamente com o mastodonte organizado por Roberta Medina.

Ainda assim, não por isso o primeiro dia deste novo festival foi um 'flop'. Antes pelo contrário. Esperavam-se cerca de 40 mil pessoas e, pelo que foi possível apurar pelo ambiente que se fazia sentir, esse número terá estado bem próximo da realidade.

O dia começou logo às 16h com o brinde da Curadoria Chelas É o Sítio, projeto coordenado por Sam The Kid, o nome ressonante deste bairro lisboeta que verá o seu projeto arrancar cada um dos três dias de festival. Foi logo às 17h, no entanto, que o palco principal foi oficialmente inaugurado por Rodrigo Leão e a sua acompanhante orquestra. Num dia em que a maioria dos visitantes procurava a eletrónica dos britânicos The Chemical Brothers e dos alemães Kratfwerk e Moderat, houve quem olhasse com curiosidade para a escolha de Leão neste line-up, uma vez que a sua música não poderia estar mais longe dos sons dissonantes e ecléticos de alguns dos restantes nomes do cartaz.

Ainda assim, houve muito a dizer sobre o desempenho do antigo membro dos Madredeus e Sétima Legião, que lançou em 2020 O Método.

Foi deste álbum, aliás, que partiram alguns dos primeiros temas do concerto, em que Leão, sóbrio no seu estilo, se apresentou desejando “longa vida” ao Kalorama. Houve ainda espaço para uma versão inédita do clássico Pasión, num concerto que parecia destoar da restante ‘vibe’ do festival, mas que, mesmo assim, conseguiu captar a atenção do punhado de festivaleiros que se juntava em torno do palco MEO, vulgo palco principal deste festival, localizado num estilo de vale que prometia encher-se à medida que a noite se aproximava.

Blake emociona

O primeiro dia da primeira edição do Kalorama dividiu-se entre duas nacionalidades, principalmente: britânicos e alemães. De um lado, Kraftwerk e Moderat traziam o toque germânico ao Parque da Bela Vista, mas, por outro, aos cabeças de cartaz The Chemical Brothers juntaram-se ainda os conterrâneos James Blake e Years & Years.

Coube, aliás, a James Blake ocupar o palco principal do festival à medida que o sol se punha, condizendo com o seu estilo de música romântico que mistura eletrónica com R&B e soul. Esperava-se uma grande dose de Friends That Break Your Heart, o seu quinto álbum de estúdio, lançado em 2021, mas Blake preferiu presentear os festivaleiros com uma variedade de temas da sua discografia.

O palco MEO foi-se enchendo de público curioso que deixava para trás o Palco Colina, onde Xinobi acabava de maravilhar. Era a hora de Blake brilhar, começando com Life Round Here, de do álbum de 2013, Overgrown. Before, Limit to Your Love e Say What You Will, com a ajuda do público, continuaram o set do britânico que admitiu já ter ‘saudades’ de Portugal, onde esteve em 2019, no NOS Primavera Sound.

À medida que o sol se pôs, Blake cantou e encantou, saltando entre Love Me In Whatever Way, Mile High e CMYK, com uma raridade na setlist: You’re Too Precious, para muito encanto do público, que começava a aquecer motores para o que aí vinha.

A orquestra de Olly Alexander

Coube aos colombianos Bomba Estéreo fazer, desde o palco secundário, a ‘ponte’ entre os britânicos James Blake e Years and Years no palco principal, e, apesar da grande qualidade sonora do grupo responsável por ‘Fuego’, que mistura o folclore colombiano com a música eletrónica, o pobre trabalho técnico do som no Palco Colina – vulgo palco secundário – deixou muito a desejar no set dos colombianos.

Assim que as luzes se desligaram no palco secundário, no entanto, as massas viraram-se para o Palco MEO, onde Olly Alexander, que não terá esquecido a passagem por Portugal em 2016, na altura para pisar o palco principal do NOS Alive, se preparava para trazer de volta algum do seu pop tão peculiar, quase a soar a uma versão ‘moderna’ dos Pet Shop Boys – aliás, houve até espaço para uma cover do tema 'It's a Sin', precisamente da autoria desta banda dos anos oitenta, e que serve de canção oficial à série televisiva homónima onde Olly Alexander é protagonista.

“Então, gostosas?”, brincou o britânico, em português, depois de encher o Parque da Bela Vista com Sweet Talker e Shine.

Se, em 2016, o álbum em mãos era Communion, Years and Years – agora com Olly Alexander a tomar as rédeas num formato praticamente solo – chegaram ao Kalorama mais maduros, mais completos, com Night Call, o seu terceiro álbum de estúdio, lançado em janeiro deste ano, baixo o braço.

A noite foi de farra em torno do conjunto liderado por Alexander, que pareceu evoluir muito no que toca à sua presença em palco relativamente a concertos anteriores em Portugal, mostrando-se mais seguro e mais sólido, e trazendo consigo um verdadeiro espetáculo não só musical mas também visual, com cada tema acompanhado por um conjunto a condizer de vídeo e luzes.

Kraftwerk com pouca adesão

Um dos nomes mais interessantes desta primeira noite do Kalorama eram os alemães Kraftwerk, pioneiros da música eletrónica alemã e nomes inconfundíveis quando se fala do mundo dos sintetizadores, do fascínio pelos primórdios da computação e da música eletrónica europeia.

Novamente, no entanto, tal como aconteceu com Bomba Estéreo, a fraca qualidade do som no palco secundário acabou por custar alguma emoção ao concerto, que, talvez por este problema ou por um simples desinteresse do público, foi perdendo pessoas desde o seu arranque.

Talvez também porque, ao mesmo tempo, no palco principal, 2ManyDJs e Tiga começavam o seu concerto, chamando também a atenção do público que foi gradualmente abandonando o concerto dos alemães. No entanto, pouca sorte teve quem queria ver esta dupla, pois o concerto acabou ao fim de alguns minutos, devido, precisamente, à sobreposição de ruído com o palco onde tocavam os alemães.

Daqueles que decidiram, no entanto, manter-se frente ao Palco Colina, muitos pareciam mais interessados em conversar ou trocar mensagens do que propriamente em ouvir alguns dos temas clássicos do quarteto que surgiu em palco da forma que já habituaram o mundo: lado a lado, cada um controlando a sua ‘consola’ em forma de ’T’.

Para os amantes da banda dos anos 70, no entanto, a noite foi uma delícia: ouviu-se Das Model, Tour de France, Radioactivity e Autobahn, entre outros temas, sendo estes alguns dos mais conhecidos da sua discografia, que percorre várias décadas.

O espetáculo visual não deixou nada a desejar, ao contrário do som, o que ‘ressalvou’ o concerto dos alemães, que precedeu o cabeça de cartaz para este primeiro dia de festival na Bela Vista: os britânicos The Chemical Brothers

Amor de irmãos

Batiam as 23h30 no relógio quando The Chemical Brothers subiram ao Palco MEO, e já as massas rodeavam energicamente o principal palco do recém-nascido MEO Kalorama.

E que energia que invadiu o Parque da Bela Vista. Durante mais de uma hora, praticamente sem interrupções, um cosmos de luzes e sons vindos dos confins da terra fizeram vibrar os corpos de quem se via incapaz de contrariar a vontade de dançar ao som dos temas da dupla britânica de irmãos que nasceu das entranhas de Manchester em 1989.

Um mar de pessoas fitava o palco principal do Kalorama para o último – e principal – ‘grande’ concerto da noite, e as expectativas foram, no mínimo, ultrapassadas. A regra foi dançar, dançar e dançar até não dar mais. Tudo abanou no recinto do MEO Kalorama ao som dos Chemical Brothers, que foram ao baú buscar clássicos como Hey Boy Hey Girl e Setting Sun.

O Palco MEO transformou-se numa autêntica discoteca de música eletrónica ao ar livre, com direito a bolas de plástico a passar de mão em mão e tudo, entre as batidas eletrizantes da dupla britânica e os raios de luz que mais pareciam lasers emanados desde o palco.

O primeiro dia de MEO Kalorama fechou com altos e baixos, misturando vários géneros em simultâneo e lucrando com as vantagens disso, ao mesmo tempo que sofreu com as suas desvantagens. O fecho da noite ficou à responsabilidade dos alemães Moderat e da brasileira Marina Sena.

O segundo dia do Kalorama tem como grandes cabeças de cartaz os Arctic Monkeys, mas o mesmo dia terá ainda The Legendary Tigerman, Alice Phoebe Lou, Roisin Murphy e Bruno Pernadas.

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