Que parvo que eu sou…

Eu gosto de coisas parvas, fora da caixa, coisas que irrompam da normalidade e que me ajudem a sair de mim e da minha realidade e isso é uma coisa que a arte sabe fazer, porque apreende a realidade que está para lá da realidade… aquela que ninguém vê, a não ser os artistas.

Eu gosto de coisas parvas… gosto de músicas parvas, com letras parvas… 

Há uns anos voltei a rever as telenovelas mais parvas da minha infância – autênticas obras-primas do Brasil: o Roque Santeiro; A Rainha da Sucata e, claro, Tieta. Qualquer uma destas telenovelas são de uma candura e de uma arte incríveis, com atores de exceção e com personagens inacreditáveis.

Quem se lembra destas telenovelas sabe do que estou a falar. E não se admirem de um padre gostar de rever as coisas da sua infância, porque os padres – para os que não sabem – também tiveram infância como todas as outras pessoas, porque também são pessoas…

Não há personagens como a Tancinha, do Sassaricando, ou a Arménia, da Rainha da Sucata. Quem não se lembra do Sinhozinho Malta, do Roque Santeiro?

Eu gosto de coisas parvas, fora da caixa, coisas que irrompam da normalidade e que me ajudem a sair de mim e da minha realidade e isso é uma coisa que a arte sabe fazer, porque apreende a realidade que está para lá da realidade… aquela que ninguém vê, a não ser os artistas.

Pois eu sempre gostei da música dos Deolinda – Que parva que eu sou… – não por ser uma música parva, mas por ter uma letra tão real que até parece parva…

É assim que me sinto agora… completamente parvo! Perdido e sem saber para onde me virar…

O que eu disse na última semana está-se a realizar e iremos ver o crescendo de casos de pedofilia dentro da Igreja a um ritmo de um por semana. E todos aqueles que colocarem em causa o que está escrito na Tábua dos Dez Mandamentos – que são os jornais – vai diretamente para uma sessão de fisioterapia por apedrejamento. 

Não tenho dúvidas de que os bispos, os padres e os administradores eclesiais não tiveram uma gestão correta e transparente. Basta ouvir as declarações do bispo do Porto da última semana para percebermos que os bispos não estão minimamente preparados para enfrentar este fenómeno, que não é novo, nem é exclusivo da Igreja, mas que são eles que, cá dentro, devem gerir.

Agora… como diziam os Deolinda… mas parva eu não sou…

Depois de ouvir e ver a reportagem sobre aquele jovem que morreu com HIV e que esteve em criança no tal orfanato moçambicano onde terão ocorrido os tais abusos sexuais, fiquei com a profundíssima convicção de que este professor, que tem denunciado o caso às diferentes autoridades, desde 2011, tem toda a razão: aquela criança, agora mais velha, no leito de morte, estava a dizer a verdade. Esta é a minha convicção!

Acontece, porém, que, apesar de gostar de coisas parvas e apesar de ser parvo, não gosto que me façam de parvo. 

Depois ter lido as diferentes notícias de todos os jornais ficam-me mais interrogações do que convicções… 

A primeira coisa que me parece estranha nesta gestão dos casos de pedofilia é o seguinte: porque razão se dirigem aos bispos, aos superiores religiosos ou aos diretores de colégios a denunciar um caso de pedofilia quando, na realidade, o deveriam fazer em sede própria – os crimes denunciam-se às autoridades policiais.

A segunda coisa que não está claro é seguinte: se a queixa chegou às autoridades judiciais italianas, às autoridades moçambicanas e às autoridades portuguesas e o caso ficou arquivado em todas (pelo menos é isso que aparece nas notícias), porque é que quem está a encobrir é o bispo? Se os agressores são ilibados pelas investigações judiciais civis deve o bispo ser mais papista do que o Papa?

Eu não tenho a menor dúvida de que ouve e há casos de pedofilia na Igreja. Não tenho, também, a menor dúvida que há casos encobertos… Mas há um mínimo no tratamento dos dados que convém destacar ao tratar estes casos… para que a informação não traga mais confusão do que clarificação…