Do Eclesiastes ao ativismo ambiental

À exceção de algumas ativistas tocadas pela graça de Afrodite, a visão dos restantes membros do grupo nus poderia provocar mais danos à causa ambiental do que o derrame de um petroleiro na costa portuguesa. 

Por João Cerqueira

No Antigo Testamento, está escrito o seguinte no livro do Eclesiastes: «Para tudo há um momento e um tempo para cada coisa que se deseja debaixo do céu: tempo para nascer e tempo para morrer, tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou, tempo para matar e tempo para curar, tempo para destruir e tempo para edificar […]». 

Inspirados por esta sabedoria bíblica, os novos ativistas ambientais resolveram criar o seguinte mote para a sua ação direta: «Há um tempo para admirar a arte e há um tempo para a vandalizar, um tempo para sermos civilizados e um tempo para sermos imbecis». E vai daí que começaram a atacar com sopa de tomate e puré de batata obras de arte como o quadro de Vermeer de Delft Rapariga com Brinco de Pérola, o quadro de Van Gogh Os Girassóis e ainda Os Palheiros de Claude Monet. Depois, sob a complacência dos vigilantes, gritaram frases contra os combustíveis fósseis e colaram-se às paredes dos museus e aos vidros que protegiam as pinturas. 

Tenho dúvidas quanto à eficácia deste método. 

Dantes, as ativistas ambientais e a favor dos direitos dos animais comiam a sopa e o puré em casa, para de seguida saírem em protesto para a rua com os seios desnudados ou completamente nuas. Esta forma de protesto tinha mais vantagens pois, além da mensagem ambiental, conseguiam ainda demonstrar, ante o olhar lascivo dos polícias e outros mirones, que a verdadeira causa das agressões à natureza e aos animais era a sociedade patriarcal branca colonialista e homofóbica. Se assim não fosse, os polícias que as prendiam e os mirones que se babavam teriam olhado para aquelas mamas e rabos como quem olha para uma salada de rabanetes ou um pudim de tofu – pode-se comer, mas só com muita fome.

Como tal, aconselho os nossos ativistas a não atirarem caldo verde ou papas de sarrabulho aos Painéis de São Vicente Fora atribuídos a Nuno Gonçalves, às obras de José de Guimarães, Paula Rego ou Vieira da Silva. Num país onde já há quase quatro milhões de pobres, não ficaria bem desperdiçar comida. Porém, depois de ver as imagens dos ativistas do Climáximo a protestar contra a Galp, tão-pouco os aconselho a virem em pelote para a rua no próximo protesto. À exceção de algumas ativistas tocadas pela graça de Afrodite, a visão dos restantes membros do grupo nus poderia provocar mais danos à causa ambiental do que o derrame de um petroleiro na costa portuguesa. Além de poderem ser confundidos com trogloditas patriarcais ou simpatizantes do Templo do Povo de Jim Jones. Portanto, nada de rabos ao léu e pilinhas a abanar.

Resta-lhes, por isso, a cola.

Já foi referido que os ativistas ambientais não deveriam usar colas vindas de industrias poluentes. Contudo, como as suas roupas, os sapatos, os telemóveis – ou seja, tudo o que usam – foi criado pelo sistema capitalista que abominam e acusam de destruir o planeta, então, mais uma incoerência não terá importância. Torná-los-á, até, coerentes na incoerência. No entanto, o Climáximo pode, com apenas uns tubinhos de cola, simultaneamente protestar contra as empresas poluidoras e ensinar os seus camaradas europeus a criar arte em vez de a destruir. 

É muito simples. 

Assim como Christo e Jeanne-Claude embrulharam o Reichstag em Berlim, a Pont Neuf em Paris e umas ilhotas na Florida, os ativistas do Climáximo podem embrulhar-se a si próprios no próximo protesto. Depois de empunharem faixas e gritarem contra a multinacional visada, grudam-se ao chão, para por fim vir o único ativista que não se colou embrulhá-los com papel reciclado – uma coerência incoerente – e atá-los com um laçarote cor-de-rosa. Uma bela prenda. E como todo este processo será filmado pelos jornalistas, estará assim criada uma obra de arte multimédia, um Happening ecológico que tornaria os maiores desvarios de Allan Kaprow esboços de principiante. 

Mostrado nas televisões de todo o mundo capitalista e exibido na Art Basel, na Bienal de Veneza, no Fantasporto e no Pornhub, o vídeo despertará a consciência ecológica de milhões de pessoas e ensinará aos ativistas do grupo Just Stop Oil que tentar adaptar a sabedoria do Eclesiastes aos seus delírios pode redundar numa grande burrice.

No entanto, apesar das boas intenções e do protesto pacífico, haverá uma vítima: a Greta. A notoriedade crescente do Climáximo – a colarem-se e a embrulharem-se na Torre Eiffel, junto ao Big Ben, em Wall Street e em todo o lado onde não haja campos de concentração e repúblicas populares – tornará a jovem sueca insignificante e rapidamente esquecida. Como tal, é provável que peça um Visto Gold e se junte ao grupo.