Reorganização das urgências psiquiátricas. Direção executiva do SNS aposta em resposta em rede

“O que estão a tentar fazer, e que me parece bem feito, é uniformizar o funcionamento dos serviços de urgência”, observa o psiquiatra Henrique Prata Ribeiro.

Foi anunciada, ontem, pela direção executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS), uma reorganização das urgências de Psiquiatria, que "mantém as respostas existentes em presença física noturna (Porto, Lisboa e Coimbra), aumenta as respostas em presença diurna (Guimarães, Viana do Castelo e Cascais) e ainda permite uma resposta de proximidade em regime de prevenção distribuída por praticamente todo o território nacional", como adiantou à agência Lusa o organismo dirigido por Fernando Araújo.

"No seu conjunto, a segurança dos cuidados às situações urgentes é reforçada por esta resposta em rede", realçou a DE-SNS, criada este ano, sendo que justificou a reorganização com o facto de ser "importante para as urgências de Psiquiatria estandardizar procedimentos em todo o país, definir e manter consistente a rede de pontos de acesso do SNS e estabilizar os critérios de referenciação". Assim, a equipa de Fernando Araújo espera garantir "proximidade, a equidade e a segurança, numa resposta que seja do conhecimento das instituições, dos profissionais de saúde, do INEM e SNS24 e dos utentes e familiares, com previsibilidade e qualidade".

A direção executiva almeja também alcançar uma maior ligação com os cuidados de saúde primários e com as estruturas da comunidade, através da constituição de equipas comunitárias de saúde mental, sendo que para os hospitais "está a haver um reforço significativo do número de psicólogos nos serviços de Psiquiatria e Saúde Mental".

Sabe-se que as 20 equipas comunitárias já constituídas ou em fase avançada de constituição, com financiamento do Plano de Recuperação e Resiliência, presumem a contratação de 25 psicólogos e as 20 que serão implementadas nos próximos dois anos permitirão a contratação de mais 30 psicólogos para os Serviços Locais de Saúde Mental. "Agora vêm 84 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência e vamos ver como serão geridos e distribuídos, sendo que irão permitir, entre outras coisas, a criação de importantes equipas comunitárias multidisciplinares. Os cuidados irão até aos doentes ao invés de serem os doentes a vir até aos cuidados", disse, em declarações ao Nascer do SOL, há um ano, o psiquiatra Henrique Prata Ribeiro, a propósito desta temática.

"O que estão a tentar fazer, e que me parece bem feito, é uniformizar o funcionamento dos serviços de urgência. É importante definir critérios de acesso aos mesmos e, dentro disto, perceber como deve ser feito. Até é algo que, nos Açores, dentro da implementação do Programa para a Saúde Mental, estamos a fazer", diz, em declarações ao Nascer do SOL, o médico que exerce no Hospital Beatriz Ângelo e no setor privado. "Estes critérios de referenciação devem ser uniformizados. Esta abordagem passa muito por uma linha que tem os cuidados de saúde primários como base".

"Os documentos também mostram quais são os casos que devem ser diretamente triados para a Psiquiatria: há alguns que devem passar primeiro pela Medicina Interna e só depois devem chegar à Psiquiatria, se não houver resolução", observa o psiquiatra. "São consideradas exceções e triadas diretamente para a psiquiatria, após contacto prévio com o chefe de equipa de psiquiatria, as seguintes situações: casos enquadráveis na Lei de Saúde Mental, (mandados de Condução para avaliação clínico-psiquiátrica urgente) que têm precedência no atendimento; crise suicidária (excluindo-se ativamente a intoxicação concomitante com álcool, drogas e/ou fármacos que são sempre avaliadas previamente pela área médica); evidente descompensação psicótica (atividade delirante ou alucinatória auditiva) em doente com atual seguimento psiquiátrico por psicose (excluindo-se ativamente a intoxicação concomitante com álcool, drogas e/ou fármacos)", lê-se na documentação relativa a este processo de reorganização.

No entanto, existe mais informação disponível. Para além destas exceções, é esclarecido que "a prestação de cuidados psiquiátricos urgentes à população deve ser feita num serviço de urgência especializada que visa o atendimento das situações que não podem aguardar por agendamento programado", sendo elucidado que "os doentes em acompanhamento nos Serviços Locais de Saúde Mental [SLSM] deverão, numa situação que consideram urgente, recorrer preferencialmente ao seu (sua) psiquiatra assistente".

Assim sendo, os doentes "deverão recorrer à urgência de psiquiatria mediante a indicação do psiquiatra assistente que, preferencialmente, escreverá uma carta de referenciação explicando o motivo e propósito do pedido de observação no SU". Portanto, "os SLSM deverão prever mecanismos que garantam esse atendimento e a substituição dos psiquiatras que se encontrem ausentes, nomeadamente através de respostas como por exemplo a consulta de crise".

"Há uma parte que assenta mais na vertente comunitária e a questão relacionada com a consulta de crise deve ser esclarecida: falta definir em que moldes ocorre", explica o profissional de saúde. "Ainda não pensei suficientemente nisto. Não quero pronunciar-me ainda", clarifica, apelando a que os doentes graves e a doença mental grave não sejam esquecidos. "As equipas comunitárias têm um papel importantíssimo, mas os cuidados hospitalares também".

"Finalmente está a ser concluída a contratação de 40 psicólogos para os cuidados de saúde primários, um processo que durou mais de quatro anos", declarou a DE-SNS, reconhecendo a "necessidade de mais psicólogos na rede, pois o seu desempenho está associado a uma melhoria da resposta aos problemas da saúde mental".