João Canijo, o ‘mau’ vivant

Com dois filmes no Festival de Berlim, ‘Mal Viver’ e ‘Viver Mal’, com o primeiro a vencer o Urso de Prata, o realizador português celebra o principal galardão que já recebeu na sua carreira. Recordamos a história de vida do cineasta.

Com dois filmes que se interligam no festival de cinema Berlinale, ‘Mal Viver’ e ‘Viver Mal’, o realizador português, João Canijo, foi o vencedor do Urso de Prata, Prémio do Júri, conquistando assim o mais importante prémio da sua carreira.
Para o cineasta, este prémio «significa uma nova vida» e «prova que o cinema português tem qualidade».

‘Mal Viver’ conta no seu elenco com atrizes como Rita Blanco, Anabela Moreira, Madalena Almeida, Cleia Almeida, Vera Barreto, Filipa Areosa, Leonor Silveira, Lia Carvalho, Beatriz Batarda, Leonor Vasconcelos e Carolina Amaral e os atores Nuno Lopes e Rafael Morais. É a história de uma família de várias mulheres de diferentes gerações, que arrastam uma vida dilacerada pelo ressentimento e o rancor, que a chegada inesperada de uma neta vem abalar, no tempo de um fim de semana.

Já ‘Viver Mal’, que esteve na secção Encontros, dedicada a «novas visões cinematográficas», fala sobre a perspetiva de um homem que está dividido entre estar presente para sua esposa e o espaço que a sua mãe ocupa entre os dois, uma mãe que incentiva o casamento da sua filha para possibilitar seu próprio caso de amor com o seu genro e outra mãe que vive através da sua filha, impedindo-a de tomar as rédeas das suas próprias decisões. 

No discurso de agradecimento, o realizador agradeceu à equipa de produção e distribuição, assim como à equipa que consigo criou o filme, «composta quase exclusivamente por mulheres».

De historiador a cineasta

João Altavilla Canijo nasceu no Porto, a 10 de dezembro de 1957. Apesar de ter seguido os seus estudos em História, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, entre 1978 e 1980, acabou por abandonar para seguir a sua paixão, o cinema.

Ingressou no curso de Cinema da Escola Superior de Teatro e Cinema e, mais tarde, completou o mestrado em Estudos Cinematográficos pela ESTC.

Após abandonar os estudos, trabalhou como assistente de realização com mestres como Manoel de Oliveira, Wim Wenders (’O Estado das Coisas’, 1982), Alain Tanner (’A Cidade Branca’, 1983), Paulo Rocha (’O Desejado’, 1987), Jaime Silva (’Fim de Estação’, 1982) ou Werner Schroeter (’O Rei das Rosas’, 1986).

A sua estreia enquanto realizador principal aconteceria em 1983, quando criou a curta-metragem ‘A Meio-Amor’, e, cinco anos mais tarde, realizou a sua primeira longa-metragem, ‘Três Menos Eu’, iniciando assim uma longa colaboração criativa com a atriz Rita Blanco. Este filme acabou por ser selecionado para o Festival de Cinema de Roterdão nesse mesmo ano.

Durante os anos 1990, realizou ‘Filha da Mãe’ (1991) e ‘Sapatos Pretos’ (1998), mas também séries de televisão como ‘Alentejo Sem Lei’ e ‘Sai da Minha Vida’ e peças de David Mamet e Eugene O’Neill.

O seu filme mais aclamado chegaria em 2001, ‘Ganhar a Vida’, um drama que conta com Rita Blanco no papel de Cidália, uma mulher portuguesa que vive numa comunidade de emigrantes nos arredores de Paris e que um dia vê o filho morrer num tiroteio. 

Os sucessos na carreira de Canijo continuariam com o ‘Noite Escura’ (2004) a estrear-se no Festival de Cannes e a ser o filme português escolhido como candidato ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro desse ano. Em Portugal, venceria o Globo de Ouro para o Melhor Filme.

Já em 2011, ‘Sangue do Meu Sangue’, um drama social sobre o amor de uma mãe pela sua filha, o amor de uma tia pelo seu sobrinho e de como estas estão dispostas a sacrificar tudo para os salvar, também seria escolhido como o filme português para concorrer aos Óscares.

Apesar do sucesso nacional, com o cineasta a vencer o Prémio Melhor Realizador no Festival Caminhos do Cinema Português, ou em festivais internacionais de cinema, como o de San Sebastian, este não seria o suficiente para se tornar o primeiro filme português a chegar à cerimónia de prémios de Hollywood.

Depois de ‘É O Amor’ (2013) e ‘Fátima’ (2017), Canijo chega agora a, ‘Mal Viver’ e ‘Viver Mal’, filmes que considera serem os maiores sucessos da sua carreira, e que mereceram elogios não só da crítica, como dos líderes do governo português.

«O cinema português está num momento muito bom e o [galardão] é prova da excelência do nosso cinema. É um grande orgulho para Portugal», disse o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa.

«João Canijo está de parabéns pelo Urso de Prata Prémio do Júri atribuído ao filme ‘Mal Viver’ na Berlinale. Merecido reconhecimento internacional para um cineasta português com uma obra marcante e de grande maturidade. O cinema nacional demonstra uma vez mais a sua excelência», escreveu, na sua conta pessoal do Twitter, o primeiro-ministro António Costa.

Numa altura em que ambos os filmes se preparam para a estreia nas salas portuguesas, no dia 11 de maio, o realizador já está a pensar o seu próximo projeto, que será sobre a encenação de uma peça de teatro e que conta também com protagonistas mulheres.