A importância dos contos infantis

As novas histórias infantis ganham pelas imagens mas perdem pela escassez e pobreza do conteúdo.

Os contos infantis fazem parte da nossa tradição e a maioria das crianças ouvem histórias desde pequenas.

Antigamente os avós eram os grandes contadores de histórias, porque além de terem uma longa história para partilhar, também tinham mais tempo e disponibilidade para o fazer. Lembro-me das histórias que a minha avó me contava à medida que as ia criando, à noite antes de adormecer – muitas vezes ela adormecia a meio enquanto eu ficava em pulgas para saber o final.

Agora as crianças estão menos com os avós e os pais assumem o papel do contador de histórias, a par dos educadores. Há até várias escolas que incitam a leitura em casa emprestando um livro por semana.

Uma vez numa reunião de pais algumas mães queixavam-se de que os filhos levavam sempre a mesma história para casa. A educadora tentou explicar que as crianças levavam a história que escolhiam e que por vezes queriam ver aquela mais do que uma vez. As mães não ficaram muito convencidas.

Os contos infantis são importantes para as crianças porque – além de deixarem o bichinho da leitura e de aprender através dos livros – a identificação com as personagens e com a história permite-lhes pensar e resolver algumas questões e conflitos com que se confrontam e debatem. Ao mesmo tempo podem trazer-lhes esperança, dar confiança ou segurança. Não é por acaso que muitas vezes o herói é o mais pequeno, o mais baixo ou o mais desajeitado, que cria facilmente na criança uma identificação. Nem é à toa que na maioria das vezes é o pequeno que ganha ao grande ou o menos bonito que sai bem sucedido. E as crianças ouvem as histórias com atenção, fazem perguntas, olham com aqueles olhinhos arregalados para as imagens e tentam conhecê-las, imaginá-las e, muitas vezes sem se aperceberem, encontrar pontos em comum e soluções para as suas questões. Às vezes o irmão mais novo pode ganhar ao mais velho, não é impossível ser mais forte do que o colega mau da escola ou até dar a volta a um conflito que parecia irresolúvel. Aqueles sentimentos são partilhados e a criança deixa de se sentir tão sozinha: se o menino ou bicharoco do livro consegue, ela também vai conseguir.

Por isso é que há histórias que são requisitadas vezes sem conta, não por falta de imaginação ou facilitismo dos educadores, mas porque a criança a quer explorar melhor, porque há qualquer coisa que a fascina, que quer entender e relê ou volta a ouvir até conseguir perceber, elaborar ou resolver e não precisar mais dela.

As novas histórias infantis ganham pelas imagens mas perdem pela escassez e pobreza do conteúdo. As personagens más e as situações de perigo foram substituídas por histórias encantadoras, amorosas, engraçadas, moralistas ou muito direcionadas para um tema. Acabou a maldade e o medo. Os enredos geralmente são fracos e as histórias são simples, curtas e imediatas. Talvez sejam o reflexo de nós próprios, da vida acelerada, sem tempo, mas repleta de imagens bonitas e da tendência para proteger as crianças e passar a ideia de um mundo sem maldade nem perigos. Um mundo sem dúvida mais pobre e menos emocionante ou desafiante, que só passa metade da realidade e deixa uma lacuna para a identificação e resolução de alguns conflitos internos reais.

Psicóloga na ClinicaLab

Rita de Botton