ANIM, o arquivo que toma conta de todo o cinema português

O Arquivo Nacional das Imagens em Movimento (ANIM), o mais importante arquivo do cinema português, funciona numa quinta perto de Lisboa, com laboratórios, milhares de bobines e quilómetros de película, cuja preservação está ameaçada pela actual conjuntura de crise.

face menos visível da cinemateca, o anim funciona desde 1996 no concelho de loures, numa quinta com mais de 8.000 hectares, feita de vários edifícios e rodeada por uma área de pinhal.

nos cofres, a temperaturas e níveis de humidade controlados, estão guardados tesouros do cinema português – e também algumas obras estrangeiras -, desde finais do século xix até à actualidade, incluindo curtas e longas-metragens, ficção, documentário, filmes familiares, públicos e privados.

actualmente estão inventariados mais de 70.000 materiais, dos quais 50.000 são fílmicos, em película, guardados em centenas de bobines, armazenadas nesses cofres, e cujos originais têm sido copiados ou digitalizados.

nos edifícios, feitos de múltiplas salas, corredores, pátios interiores, terraços e cofres sem janelas, trabalham apenas vinte pessoas, acompanhadas de complexas máquinas e aparelhos cinematográficos antigos.

numa das salas, um técnico comanda um aparelho que está a duplicar em película a longa-metragem portuguesa “serra brava”, de 1948. noutra, uma mulher verifica a qualidade da fita de um filme que a cinemateca exibirá em breve.

numa visita guiada a estes espaços, o director do anim, rui machado, admitiu à agência lusa que por ali se faz quase um trabalho de arqueologia, na identificação dos arquivos, e de paciente construção de “puzzles”, quando as obras estão degradadas ou em risco.

“o anim é um departamento que é responsável pela salvaguarda de todo o património cinematográfico, todo ele – analógico ou digital – muito perecível, que não resistirá muito ao tempo se não houver arquivos que tratem da sua conservação”, sublinhou.

e também aqui se sente a crise que atravessa a sociedade portuguesa.

a programação que a cinemateca portuguesa decidiu fazer este mês centra-se precisamente nos arquivos – e no anim -, para alertar para a situação de fragilidade que atravessa, devido a constrangimentos económicos e administrativos, por via de decisões políticas.

um dos exemplos mais directos dos cortes orçamentais está nas reservas do anim: os novos cofres climatizados estão recheados de pilhas de bobines com filmes, porque não há dinheiro – são precisos cerca de 500 mil euros – para comprar estantes.

rui machado deu ainda outro exemplo: o anim tem um dos poucos laboratórios em todo o mundo especializado em restauro de filme em película e que responde a encomendas de cinematecas da europa e américa latina.

este laboratório, que dá prestígio e receita adicional à cinemateca, corre o risco de ficar parado, por causa de problemas contratuais com três dos cinco elementos que trabalham nessa área, alertou.

o anim tem ainda de responder ao desafio do digital – “porque todo o património que está a ser produzido actualmente é digital” -, mas o departamento não tem um leitor para as novas cópias de filmes nesse formato: “significa que não podemos trabalhar esse património, e que ele deixa de ser acessível aos espectadores”, disse.

no anim, onde reina uma espécie de corrida invisível contra o tempo, na preservação da memória do cinema português, aposta-se sobretudo na preservação da película, cuja validade ainda é muito superior em relação ao digital.

“em boas condições de preservação, um filme em película pode durar 500 anos, dizem os especialistas, muito mais do que o digital”, afirmou rui machado.

lusa/sol