Cartoonista Aleix Saló retrata o pesadelo que ‘comeu a classe média’

O cartoonista catalão Aleix Saló desenhou a chanceler Angela Merkel com as mãos em “posição de diamante” de expressão carregada e outras vezes de tesoura na mão para explicar, com desenhos, os problemas actuais da classe média europeia.

O livro “Euro Pesadelo – Quem Comeu a Classe Média” do catalão Aleix Saló, publicado em português, retrata, através de cartoons a preto e branco, a “origem da crise europeia” e relata de forma humorística os factos que estão a transformar o mundo e a Europa em particular.

“Na União Europeia temos 09% da população mundial, 25% do PIB mundial e 50% do gasto social do mundo inteiro”, diz Merkel desenhada por Aleix Saló (página 187) e que nas páginas anteriores do livro oferece uma tesoura aos países ordenando cortes ou dá murros na mesa que fazem saltar de medo os Estados mais pequenos.

Merkel é apenas uma das personagens do livro mas que segundo o autor “está consciente” da encruzilhada europeia e que se “auto impôs a tarefa de reconduzir a Europa até ao caminho que a Alemanha trilha”.

O cartoonista Aleix Saló, 33 anos, autor do “Euro Pesadelo – Quem Comeu a Classe Média” desenha a actualidade mas vai buscar referências a quatro mil anos de civilização na tentativa de conseguir respostas a uma eventual crise de identidade e que “atingiu a classe média”.

“Para um humorista, ou para qualquer pessoa que tenha a actualidade como inspiração as épocas turbulentas apesar de duras são fascinantes e, para mim, este é um momento chave para a Europa. O caminho que escolhermos agora vai decidir o futuro. Estão-se a configurar muitas coisas e, apesar de não sermos conscientes, para mim é importante fazer despertar o espectador para o debate da actualidade, espanhola ou portuguesa, ou italiana ou francesa e fazê-lo ver essa mesma realidade a partir de uma ótica europeia, porque creio que se consegue um sentido totalmente novo”, disse à Lusa Aleix Saló, sublinhando que quer ser divertido e satírico.

Para Saló, a classe média é identificada de forma diferente por cada país europeu mas pode ser retratada como a classe trabalhadora que conseguiu evoluir e superar diversas crises com “receitas de longo prazo”, fomentando a poupança, o investimento nos estudos dos filhos, trabalho em empresas durante 10 ou 15 anos e que passou do aluguer da casa à compra de habitação própria.

“Não há classe média sem património mas agora entramos numa época de volatilidade em que tudo muda muito rapidamente, as empresas já não contratam ninguém durante 20 anos e pela primeira vez aqueles que adoptaram a receita de largo prazo estão a sair muito prejudicados e essa é a classe média, aquele que tem património ou poupanças é aquele que está a sofrer mais”, diz o desenhador catalão que se mostra preocupado com “os dias que correm”.

“Estas mudanças, tanto no mundo laboral como na economia e na forma como os Estados investem nos gastos sociais foram um míssil que atingiram a classe média. Agora temos os pobres cada vez mais pobres ou os ricos cada vez mais ricos e quando a classe média falha quem sofre é o Estado de bem-estar”, afirma Saló que encontrou em várias visitas ao Parlamento Europeu matéria para desenhar e escrever.

“Vou continuar a fazer mais visitas ao Parlamento Europeu, como fiz para este último livro porque creio que é um tema muito pouco explorado e que no campo da cultura popular, neste caso através dos comics ainda há muito para fazer”, refere o cartoonista que assinou títulos como “Simiocracia: crónica de la gran ressaca económica” (2011), “Fills dels 80: la generació bombolla” (2009), em Espanha.

O “Euro Pesadelo – Quem Comeu a Classe Média” (Bertrand Editora – 187 páginas) foi lançado na sexta-feira em Portugal.

Lusa/SOL