Chefs e donos de restaurantes já começaram a emigrar

A crise e o aumento do IVA na restauração têm levado chefs de alta cozinha a fechar os seus restaurantes, a apostar em negócios no estrangeiro, a baixar os preços ou a aderir a ‘vouchers’ de descontos.

luís baena prepara-se para abrir um restaurante no bairro londrino de
notting hill. no verão do ano passado, fechou o manifesto, em lisboa.
“não há milagres”, defende, numa alusão ao aumento do iva na restauração
para 23%, citando exemplos de outros países na europa onde este imposto
é bem mais baixo, não ultrapassando os 10%.

“quem seja sério, não
fará face. quem não for sério, vai fugir aos impostos”, avisa,
sublinhando que, “felizmente, ainda há muitas pessoas sérias” no setor.
as margens de lucro “são cada vez mais reduzidas”.

apesar de o
panorama “não ser animador”, o chef vai manter projetos em portugal, mas
apenas como consultoria, prevendo a abertura, em breve, de um
restaurante de petiscos, perto do arco do cego, e de um espaço para
‘catering’.

josé júlio vintém também garante que não virou as
costas a portugal. há poucas semanas, o responsável do tombalobos
(portalegre) fechou as portas do restaurante e dedicou-se ao seu espaço
no brasil.

no facebook, explicou a decisão: “tentei conciliar os
dois projetos, mas neste momento, com as regras do jogo que estão
definidas em portugal, acho mais sensato hibernar o lobo. vou-me radicar
em recife com a família por uma questão de logística e estabilidade
familiar. como é óbvio, virei a portugal regularmente e estou mais que
disponível para continuar a criar, participar e colaborar com a
gastronomia nacional”.

foi também nesta rede social que augusto
gemelli anunciou, há dias, o encerramento do restaurante que dirigia há
13 anos, perto do parlamento. na mensagem, o chef italiano afirma que a
“pressão exercida desde 2008 sobre a indústria da restauração e o mundo
do turismo chegou a um ponto limite insuportável e o reflexo disto é a
autêntica razia que está a levar ao encerramento de tantos restaurantes
de bom nível, em todo o país”.

gemelli garante querer continuar a
viver em portugal, país onde chegou há 16 anos, “mas só o bom
desenvolvimento” dos seus novos projetos o permitirá. formações,
serviços personalizados de ‘catering’ e jantares temáticos são algumas
das ideias do cozinheiro.

o chef italiano chegou a oferecer
refeições mais baratas, através de ‘sites’ de descontos, uma solução que
também foi utilizada no largo do paço (amarante), restaurante com uma
estrela michelin.

por 29 euros, oferecia-se uma refeição completa
sem vinhos, num menu concebido para responder à atual “situação
complicada” do país e para divulgar o restaurante a nível local, explica
à lusa oriol juve, diretor-geral da casa da calçada, onde está inserido
o espaço comandado por vítor matos. a aposta teve um retorno positivo:
“funcionou extremamente bem para nós”, diz.

já este ano, o spot
são luiz, em lisboa, encerrou as portas, mas o chef responsável, fausto
airoldi, ainda não justificou a decisão. a agência lusa tentou
contactá-lo, mas até ao momento não foi possível.

vítor sobral
mantém os seus dois restaurantes em lisboa – tasca da esquina e
cervejaria da esquina, de cozinha tradicional portuguesa -, mas desde o
verão de 2011 replicou o conceito da “tasca” em são paulo, concretizando
um sonho antigo motivado por “uma ligação emotiva à cultura e ao povo
brasileiro”, uma aposta que “tem corrido bem”, garante.

o
cozinheiro afirma que neste momento vive-se um período de “incerteza em
portugal” e, por isso, não arrisca fazer previsões: “neste momento,
penso aumentar a minha atividade em portugal, mas amanhã não sei se
posso dizer o mesmo”.

sobral avisa que os restaurantes não fecham
por falta de clientes, mas devido aos custos de manutenção dos
estabelecimentos – o iva, os ordenados dos funcionários, a segurança
social, os pagamentos aos fornecedores.

henrique sá pessoa faz as
contas: hoje paga mais 250% de impostos que há um ano, mas a faturação
baixou cerca de 30%. a crise e o iva são “duas machadadas de uma vez só”
que deixaram “as contas muito apertadas”.

o restaurante alma,
diz, “cada vez mais sobrevive à custa de clientes estrangeiros”. no
natal, o cozinheiro também aderiu a um ‘site’ de descontos, que oferecia
uma refeição, sem vinhos, e o livro “ingrediente secreto”, assinado por
ele, por 39 euros. uma forma de enfrentar a quebra de faturação de
janeiro, em que o espaço fecha para férias.

outra solução
encontrada por sá pessoa é adaptar a oferta ao momento atual. no final
de fevereiro, o chef vai abrir outro restaurante em lisboa, que irá “ao
encontro de um público mais abrangente”, com o preço médio das refeições
a rondar os 20 euros.

lusa / sol