Deliberação é ‘uma inaceitável renúncia à obrigação de condenar ameaças’, Arons Carvalho

A deliberação da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que iliba o ministro Miguel Relvas de «pressões ilícitas» sobre o jornal Público é «uma inaceitável renúncia à obrigação de condenar ameaças», declarou o vice-presidente do regulador.

Alberto Arons de Carvalho foi um dos dois membros do conselho regulador da ERC que votou contra a deliberação relativa ao caso envolvendo o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares e o Público.

A deliberação, aprovada pelos outros três membros do conselho, considera que «não se comprovaram as denúncias de que o ministro tenha ameaçado promover um ‘blackout’ informativo de todo o Governo em relação ao jornal e divulgar na Internet um dado da vida privada» de uma jornalista do Público, Maria José Oliveira.

Numa declaração de voto, Arons de Carvalho descreve a deliberação como uma «inaceitável renúncia à obrigação de condenar as pressões e as ameaças à liberdade de informar e aos direitos dos jornalistas».

A opinião dos outros três membros do conselho regulador, argumenta Arons de Carvalho, «escudou-se na dificuldade de obter uma irrefutável prova material das pressões exercidas». Ou seja, perante testemunhos contraditórios do ministro e das jornalistas do Público, a deliberação da ERC optou por ignorar «diversos indícios relevantes» e a entidade absteve-se de «formular um categórico juízo de verosimilhança».

O antigo secretário de Estado da Comunicação Social de António Guterres sugere que a verosimilhança das declarações das jornalistas do Público é reforçada por uma contradição no testemunho de Miguel Relvas à ERC.

O ministro disse inicialmente ter feito apenas um telefonema à editora de política do Público, «existindo agora provas cabais de que, pelo contrário, foram duas as chamadas, como [Relvas] acabou por reconhecer», escreve Arons de Carvalho.

O vice-presidente da ERC considera «correcta» a decisão do Público de «não divulgar imediatamente as pressões exercidas». No entanto, critica a deliberação por fazer uma relação «entre a gravidade da pressão e o seu efeito prático na conduta do jornal».

«Uma ameaça não é grave pelo efeito que tem, mas pelo efeito que se pretendia que viesse a ter», conclui Arons de Carvalho.

A 18 de Maio, o conselho de redacção do Público denunciou ameaças de Relvas ao jornal e à jornalista Maria José Oliveira.

As ameaças – confirmadas pela direcção do jornal e negadas por Relvas – eram a divulgação na Internet de dados da vida privada da jornalista e um boicote noticioso do Governo ao diário, caso fosse publicada uma notícia sobre declarações do ministro no Parlamento relativamente ao chamado «caso das secretas».

A notícia acabou por não ser publicada. A direcção do jornal considerou que não havia matéria nova relevante relativamente ao último texto da jornalista sobre a matéria.

Maria José Oliveira argumentou que este segundo texto pretendia evidenciar «incongruências» nas declarações do ministro no Parlamento sobre o denominado ‘caso das Secretas’. No início deste mês, a jornalista demitiu-se do Público.

Lusa / SOL