Francisco – A aurora de um tempo novo

O país prepara-se para receber o Papa Francisco. As pessoas falam, conversam e interrogam-se acerca das possibilidades de o poderem ver, com a comunicação social a alimentar o natural entusiasmo da população através de notícias que confirmam todo um trabalho de preparação feito desde há vários ou meses.

Aliás, é uma das características dos portugueses receberem bem quem nos visita, desde os simples turistas aos mais altos dirigentes a nível mundial, qualidade de que tanto nos orgulhamos e que é sempre gratificante realçar. A visita do Santo Padre não vai fugir à regra – e nem mesmo os problemas resultantes da sua curta estadia entre nós, condicionando uma enorme concentração de pessoas em Fátima, conseguirão impedir a receção apoteótica que se adivinha.

O Papa Francisco é uma referência para nós – e, digo-o sem qualquer hesitação, será um dos marcos na história da Igreja, que as gerações futuras irão sempre recordar. A sua mensagem dirige-se a qualquer um (seja ele crente ou não) e leva-o a escutar a sua voz e a ‘aprender’ com o seu exemplo e testemunho.

«Tua palavra de fogo toca o nosso coração» – como diz o hino em sua honra, que o grande António Cartageno compôs e cuja partitura lhe entregou em mão. E essa ‘palavra’ funciona como um desafio à mudança e um estímulo à renovação.

Num artigo anterior referi-me a um dos seus ‘pedidos’ ao falar para um grupo de médicos – «Ponham mais coração nas vossas mãos» –, sentindo também ele a necessidade de uma mudança radical no comportamento destes profissionais no exercício da sua vida clínica. E este apelo pode estender-se a outras profissões ou a qualquer pessoa, em especial a quem tem responsabilidades diretivas ou está em centros de decisão.

E não terá razão de ser esta chamada de atenção? Vejamos.

A fuga constante de jovens do nosso país, procurando lá fora as legítimas condições de vida que aqui lhes são negadas – situação a que assistimos pacificamente e que já nem estranhamos, sabendo-se desde logo as repercussões que isso acarreta a nível familiar –, não precisa de ‘mais coração’ na abordagem do problema e na procura de soluções?

Quando se percebe que a ‘magia da medicina’ é vencida pela revolução informática, onde os doentes perderam o seu nome e passaram a ter um número, num processo de desumanização assustador que ‘pegou de estaca’, não seria necessário ‘mais coração’ para encontrar alternativas?

Olhando para hospitais e centros de saúde amarrados às apertadas barreiras burocráticas que, em vez de facilitarem a vida dos doentes, criam maiores dificuldades, não sentimos que é preciso ‘mais coração’ para inventar novas estratégias?

Ao ouvir a um doente dizer que durante a consulta o médico nem sequer teve tempo para ver a cara dele, por estar concentrado no computador, não é fundamental ‘mais coração’ para mudar este tipo de comportamentos?

E quanto aos cuidados continuados, não será preciso ‘mais coração’ para entender que os hospitais de retaguarda são fundamentais e urgentes no nosso país? E não deverá falar-se do investimento em força nos ‘cuidados paliativos’, apostando-se na formação específica de profissionais para cuidarem de doentes em fase terminal? Não deve haver ‘mais coração’ para seguir outro caminho e não continuar, como até aqui. a concentrar a atenção nos doentes em fase aguda, passando para segundo plano a continuidade de cuidados no ambulatório e quase ignorando o final da vida dos seres humanos?   

Se é verdade o ditado popular ‘a seguir à tempestade vem sempre a bonança’, temos de renascer na esperança de melhores dias e acreditar que há de vir um ‘TEMPO NOVO’, tal como a ‘AURORA’ que o Papa Francisco tem trazido ao mundo.

Bem-vindo Papa Francisco à nossa terra! Os portugueses estão ansiosos por te receber, ver e ouvir. Oxalá a tua vinda traga consigo a chama necessária para dar outra luz à nossa vida que, em muitos setores, parece viver nas trevas. Obrigado pela tua coragem e pela palavra certa no momento exato. Quando desceres ao nosso Portugal, também eu serei um dos muitos a saudar-te e a dizer bem alto: «Francisco tu és para nós/aurora de um tempo novo/A força da Tua voz/É a esperança do teu povo».

Luís Paulino Pereira, médico