Haia condena homem que destruiu os mausoléus de Tombuctu

Nove anos de prisão para Al-Mahdi, antigo conselheiro religioso dos islamistas que governaram o Mali

O homem que comandou a destruição de nove mausoléus e do portal centenário de uma mesquita em Tombuctu foi condenado ontem a nove anos de prisão pelo Tribunal Criminal Internacional de Haia, que pela primeira vez julgou exclusivamente um crime de destruição cultural.

Ahmad al-Mahdi já se declarara culpado pela destruição dos monumentos, classificados como Património Mundial da UNESCO e derrubados nos meses em que uma coligação islamista – em que participava um dos satélites da Al-Qaeda – assumiu o controlo de partes do norte do Mali, entre 2012 e 2013.

Durante o domínio islamista de Tombuctu, Al-Mahdi executou as funções de conselheiro religioso e líder da polícia de bons costumes que, entre outros deveres, forçava o uso do véu, impedia que raparigas fossem à escola e garantia que não se tocava ou ouvia música. 

Al-Mahdi surgiu em 2012 em vídeos com picaretas e buldózeres, atacando os mausoléus e a porta da mesquita de Sidi Yahia, argumentando que os artefactos não tinham lugar na interpretação radical do islão que os grupos islamistas queriam ver aplicada.

Esta lógica repetia as ações dos talibãs afegãos em 2001 e acabou, anos mais tarde, adotada pelo grupo Estado Islâmico que, mais do que qualquer organização fundamentalista, destruiu na Síria e Iraque monumentos, estátuas e mausoléus que disse serem “apóstatas”. 

Ahmad al-Mahdi conseguiu uma pena mais leve do que os 11 anos a que podia ter sido condenado. O tribunal disse ter levado em conta o arrependimento demonstrado ao longo do processo. Para além disso, Al-Mahdi conseguiu provar que inicialmente se opôs à ideia de destruir os monumentos, dizendo aos comandantes islamistas que isso podia causar uma revolta na população local. 

Ao longo do julgamento, Al-Mahdi, um académico do islão, disse que foi dominado por “espíritos maléficos” e aconselhou outros muçulmanos a não repetirem os seus atos. “Todas as acusações que me são atribuídas são precisas e corretas”, disse em agosto. “Peço muita desculpa. Estou verdadeiramente arrependido e lamento os danos que as minhas ações causaram.”

Raul Cano Pangalangan, o juiz que presidiu ao processo, afirmou ontem que a sentença de Al-Mahdi deve “mostrar a toda a gente que, da mesma maneira que não podemos matar outra pessoa com impunidade, também não podemos simplesmente destruir com impunidade um monumento que é património mundial” – isto mesmo que países como a Síria e o Afeganistão, onde se deram recentemente destruições semelhantes de património, não estejam sob a alçada de Haia.