O início do julgamento vai aguardar que o tribunal termine outro megaprocesso, este relacionado com burlas à ADSE, explicou fonte do tribunal.
Sem excluir mulheres, algumas das quais relataram abusos sexuais, os arguidos privilegiavam o recrutamento de homens e, de entre estes, os de baixa escolaridade, oriundos de famílias desestruturadas, padecendo de alguma deficiência física ou psíquica ou viciados em álcool e/ou drogas, especifica o MP, numa acusação de 400 páginas.
Distribuídos por diversos subgrupos, os 59 arguidos tinham um padrão de actuação similar e obedeciam a ordens de “clãs” familiares, maioritariamente com raízes em Trás-os-Montes.
A acusação, que a agência Lusa consultou, assinala a estrutura “organizada, hierarquizada e disciplinada” das redes de recrutamento e exploração de trabalho escravo e refere que chegavam a constituir empresas em Espanha para “branquear” a proveniência do dinheiro que extorquiam.
Os engajadores aliciavam os portugueses-alvo com promessas de trabalhos “bem remunerados e em condições vantajosas” em diversas quintas espanholas.
Depois, verificava-se que os donos das “fincas” (quintas) pagavam os serviços prestados, mas os “clãs” extorquiam o dinheiro aos trabalhadores, sublinha a peça acusatória.
As vítimas eram coagidas a entregar o dinheiro, “sob pena de virem a ser brutalmente sovadas”, diz um auto de declarações, citando o ofendido Fernando.
Para maximizar os quantitativos a extorquir, os trabalhadores cumpriam prolongados horários de jorna, sem descanso semanal.
“Através da intimidação e da violência física, [os principais arguidos] aterrorizavam os trabalhadores, visando obter, à sua custa e contra a sua vontade, avultados lucros”, sintetiza o MP.
Alguns arguidos são associados, igualmente, ao alojamento das vítimas em condições degradantes, ao uso de restos de comida para os alimentar, à retenção de documentos pessoais e a perseguições, em caso de fuga.
Escravidão, sequestro, coação, violação, violação de domicílio, ameaça e ofensas à integridade física integram o catálogo de crimes imputados aos 59 arguidos.
Em casos com o de Acácio, um relatório policial diz que foi explorado e privado de liberdade de movimentos ao longo de 14 anos.
O MP sustenta a acusação em escutas e prova documental, tendo ainda indicado 66 testemunhas, incluindo alegadas vítimas.
A Polícia Judiciária desenvolveu, em 2010, várias operações relacionadas com estes casos, que contaram com a colaboração das autoridades espanholas.
Lusa/SOL