MEL. A direita é federável?

O MEL rejeita a intenção de ser o aglutinador de uma federação da Direita e diz que a Convenção do final do mês servirá sobretudo para fomentar o diálogo entre forças políticas que excluem soluções totalitárias. Rui Rio percebeu finalmente que não tem em António Costa um amigo. Virar-se-á agora para a Direita?

por Henrique Pinto de Mesquita

Apesar de a organização do MEL rejeitar qualquer ideia que a coloque com um papel ativo numa possível federação da Direita, um olhar sobre os convidados facilmente dá a entender que, se tal for para acontecer, ali serão dados os primeiros passos. Quando questionada, a organização, na pessoa de Paulo Carmona, é clara: «Federação? Nem à Direita, nem à Esquerda, nem nada! Existem outros movimentos, como o de Miguel Morgado, que querem federar as Direitas. Nós não queremos federar ninguém: queremos juntar-nos contra quem é contra a liberdade», declarou ao Nascer do SOL.

Considerando a polémica que paira à volta da Convenção de 25 e 26 de maio, será seguro dizer que os incansáveis esforços da organização para que o MEL não ficasse associado à Direita foram em vão. Alinhado com a organização, Miguel Pinto Luz (orador no dia 25) partilha da ideia de que o MEL não tenciona ser motor de federação alguma. «O objetivo do MEL não é uma federação das Direitas mas sim um diálogo inicial acerca de como a Direita se deve organizar no futuro», explicou ao Nascer do SOL.

Apesar de ficar vincada a posição da organização quanto à falta de intenção em ser motor federador, fica também sublinhada a ideia de que o MEL servirá para diálogo – diálogo esse do qual muitas vezes surgem amizades, sobretudo quando alguém como Rui Rio parece agora procurar amigos à Direita, depois de desfeitas as ilusões quanto a um possível entendimento com António Costa.

Rio precisa de amigos

Face às recentes declarações do líder socialista e primeiro-ministro – «Um cata-vento, ao menos, tem pontos cardeais, o Dr. Rui Rio não tem»  –, será fácil entender que o líder dos sociais-democratas procurará amigos novos noutras paragens. E apesar de Rio reiterar não se estar a aproximar da Direita, será interessante ver como lidará com a agora óbvia necessidade de se coligar com esta para poder chegar ao Governo. Questionado por Vítor Gonçalves, na Grande Entrevista da RTP, Rio garantiu que o MEL não servirá de palco para acordo algum. «Há de haver eleições, há de haver um resultado e logo se há de ver. (…) Não vou lá por uma questão tática ou estratégica quanto ao futuro. (…) Para ir lá falar [perguntei quem iria]. E vai muita gente ligada ao Partido Socialista, porque se não fosse muita gente ligada ao Partido Socialista, obviamente que eu aí não ia (sic)».

Vamos a factos: em 2019, Rui Rio rejeitara o convite para participar no MEL; em 2020, enviara um representante; por fim, em 2021 e neste curioso contexto, não apenas irá como ficará encarregado de encerrar a Convenção.

Acerca desta presença, Paulo Carmona esclarece ao Nascer do SOL: «Rio não veio à primeira convenção. Tivemos azar, apanhámos aquilo [PSD] em convulsão. O ano passado, Rio quis estar presente, mas à última não conseguiu e enviou Paulo Mota Pinto. Este ano, já fizemos isto com mais antecedência e Rio disse que conseguiria vir. É o líder do maior partido não ‘geringonça’ e temos honra em convidá-lo».

Não obstante Rui Rio rejeitar uma aproximação à Direita, vários são os opinion makers que, fruto de ter sido recusado por Costa, a entendem agora como clara:  «Rio nunca foi muito de apoiar este tipo de coligações, porque sempre pensou que teria algo com o PS. O seu caminho para o poder seria através do PS e, agora que este lhe foi vedado, procura alternativas», diz o liberal Carlos Guimarães Pinto ao Nascer do SOL.

Uma visão que é partilhada pelo centrista Bagão Félix: «Visto de fora, Rui Rio percebeu ao longo deste tempo o que pode esperar da Esquerda. Aliás, basta olhar para a última entrevista de António Costa – de arrogância extrema e com pouco virtuosismo verbal – e reparar na maneira como trata um ex-companheiro autárquico. Se quer assumir o poder tem de olhar para a Direita. E esta ideia de federalização à Direita é o passo inevitável que tem de dar, sem doutrina mas com pragmatismo» .

Estas palavras de Bagão Félix encontram eco dentro do PSD, como confirma Miguel Pinto Luz ao Nascer do SOL: «O PSD é um espaço natural de centro-direita. Como vimos em Madrid, é possível um partido de centro-direita ganhar eleições com rutura. É sinalizador do que se pode fazer. É bom sinal Rio estar presente no MEL: tem oportunidade de demonstrar a sua liderança por ser o maior partido de centro-direita e, ainda, combater o Chega e as suas sequelas».

Além do consenso das opiniões recolhidas, há também um certo desejo implícito de que Rui Rio não tema deslocar o PSD para a Direita.

O MEL que, sem querer, poderá federar a Direita

Seguramente por necessidade, a federação da Direita é assunto que deixou de ser tabu e que ocupa território considerável na aura do MEL.

Com a entrada no Parlamento de dois novos partidos à direita do PS e o seu crescimento, esta eventual federação terá, certamente, que passar por eles. E se, por um lado, o IL não suscita grandes reações, já, por outro lado, o Chega  faz levantar fervura.

Ao Nascer do SOL, Cotrim de Figueiredo explica não ter «uma agenda de federar partidos», assim como estar indisponível «para fomentar visões iliberais do nosso futuro».

Por sua vez, Carlos Guimarães Pinto, politicamente mais livre do que Cotrim, responde ao Nascer do SOL: «Falando a título individual, parece-me que, se essa federação incluísse o Chega, a IL não estaria interessada. Acho que o Cotrim não o faria. Com CDS e PSD sim, com o Chega não».

A opinião de Guimarães Pinto é muito partilhada tanto na IL como no PSD e no CDS.

Mas há quem lembre o exemplo dos Açores e o ‘pragmatismo’ a ter por não haver outra alternativa para derrubar a Esquerda.

Bagão Félix, por exemplo, vê com bons olhos uma federação que possa surgir do MEL, não deixando claro se ‘com’ ou ‘sem’ o partido de André Ventura: «Se as questões discutidas no MEL contribuírem para algum movimento de agregação da Direita, então pessoalmente estou de acordo».

Paulo Carmona, também a título pessoal, mostra-se algo indiferente à questão de uma federação que envolva o Chega: «Se eles se entenderem, nada obsta. Esperemos que não seja necessário. Não vejo um cenário com o qual as pessoas se tenham de preocupar com isso». Questionado sobre Rio liderar a eventual federação, responde-nos que «é o candidato natural a ser líder seja para o que for».

Federada ou não, com Rio à cabeça ou não, aí teremos a Direita, no MEL, certamente desejosa de se unir para governar. Como se a vontade não bastasse,  o suposto líder do centro-direita tem sido rejeitado pela Esquerda, deixando o seu espectro político com dúvidas acerca de uma sua eventual Síndrome de Estocolmo. O MEL seguramente servirá para se juntarem à mesa e esclarecerem tudo isto, na certeza de que suspiram que possa vir, via Rio, um pouco do vento madrileno que dizem fazer falta ao país do mar.