Posição da PT em Angola em risco

Fusão foi aprovada em assembleias-gerais dos dois lados do oceano, mas regulador brasileiro suspendeu operação. Grupo vai focar-se no Brasil e pode sair de Angola devido ao diferendo entre Granadeiro e a Unitel.

O ‘casamento’ entre a PT e a Oi foi oficializado pelos accionistas. Na semana passada, os accionistas da operadora brasileira aprovaram a operação no Rio de Janeiro e o mesmo aconteceu numa assembleia-geral da PT em Lisboa. Contudo, no mesmo dia, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Brasil suspendeu por um prazo de 30 dias a oferta pública de acções da Oi. Em causa estiveram declarações à comunicação social do presidente da Oi, Zeinal Bava, sobre a fusão, que foram contra as regras do regulador brasileiro.

A Oi assegurou que a questão “será resolvida na maior brevidade possível” pelo que, com a luz verde dos accionistas, as empresas vão poder concretizar a operação no terreno. E segundo apurou o SOL junto de fontes ligadas ao processo, um dos primeiros passos será decidir até Setembro a nova estratégia do grupo e nome definitivo da nova holding. Até agora era utilizada a designação provisória CorpCo.

De acordo com os analistas ouvidos pelos SOL, o futuro da PT passará pelo Brasil e por uma eventual saída de Angola. “Com a oposição da Unitel em pagar os dividendos à PT, a estratégia de crescimento no triângulo Portugal/Angola/Brasil fica comprometida. O principal mercado será o brasileiro, com a Oi a estar atenta a oportunidades de crescimento no valioso segmento móvel, onde tem presença fraca”, explicou ao SOL Steven Santos, gestor da XTB Portugal.

Triângulo virtuoso em risco

A aliança vem trazer um novo ‘fôlego’ à PT, depois de o braço-de-ferro com a parceira angolana Unitel se ter agudizado esta semana. Na terça-feira, em comunicado, a Unitel anunciou que não iria distribuir 250 milhões de euros de dividendos à PT, justificando a decisão com uma irregularidade cometida pela operadora portuguesa.

Segundo o comunicado, está em causa o facto de em 2009 a PT ter solicitado que o pagamento de dividendos fosse feito à PT Ventures, cujo accionista é uma offshore holandesa denominada Africatel. Como o registo de accionista indica que a dona da participação angolana é a Portugal Telecom Internacional SGPS, detida a 100% pela PT SGPS, a Unitel “encontra-se na impossibilidade de efectuar a distribuição dos dividendos”.

A empresa liderada por Henrique Granadeiro respondeu dois dias depois, refutando as irregularidades. No entanto, adiantou que “a PT Ventures irá proceder às actualizações que ainda assim se revelem necessárias junto das autoridades em Angola, por forma a ultrapassar as dificuldades ora enunciadas”, lê-se no documento.

Há dois meses, o diferendo foi assumido publicamente por Henrique Granadeiro. Em entrevista à Reuters, admitiu que receber os dividendos angolanos era um “desafio”.

No comunicado desta semana, a Unitel deixou a porta aberta à possibilidade de adquirir a participação de 25% da PT, no caso de uma fusão. “Até à data, a sociedade não foi notificada da desistência deste direito por qualquer accionista”, fundamentou a operadora líder em Angola, abrindo a porta à saída da PT de Angola.

A PT admitiu que a questão pode ser discutida “ao nível dos accionistas”.

Esta ‘guerra fria’, que já se arrasta há cerca de quatro anos, poderá assim pôr em risco a aposta do grupo no triângulo virtuoso Portugal/Angola/Brasil.

Esta é a opinião de Rui Bárbara, gestor de activos do Banco Carregosa: “Penso que a PT se vai focar totalmente no Brasil e que esse triângulo já não fará sentido. Em Angola, com estas pressões que temos visto, acredito numa saída, mais tarde ou mais cedo. Neste momento, os ovos estão todos no mesmo cesto: o Brasil”.

Mas o enfoque no Brasil e uma eventual saída de Angola poderá trazer consequências negativas, alerta Steven Santos: “A principal é a PT não beneficiar do desenvolvimento do mercado angolano de telecomunicações, que tem população e dimensão suficientes para ser um dos mais importantes no continente africano, a médio prazo”. Além disso, continua, “perder a empresa do grupo que gera mais receitas em África deverá amputar parte do futuro da PT no promissor continente africano”.

sara.ribeiro@sol.pt