Supertubos. Nova geração em altas ondas

Os melhores surfistas do mundo fizeram-se aos supertubos de Peniche proporcionando um espetáculo único no Meo Rip Curl Pro Portugal. Foi uma competição imprevisível, com a nova geração a ir para fora de pé e a surpreender os favoritos do quadro masculino e feminino.

A World Surf League (WSL) leva os melhores surfistas do mundo a competir nas melhores ondas do mundo, o que tem dado origem a campeonatos épicos. A temporada de 2024 está a ser surpreendente, e até setembro há muitas ondas para rasgar. O circuito mundial tem 9 etapas e uma final americana, onde só entram os cinco primeiros do ranking mundial, que vai apurar os campeões do mundo masculino e feminino do Championship Tour (CT). Portugal tem-se afirmado no calendário mundial com a etapa na praia de Supertubos, em Peniche – é a única paragem na Europa – que se realiza há 15 anos e é uma referência internacional. Ainda este ano, a Ericeira vai receber uma prova do circuito de qualificação, o Challenge Series, entre 29 de setembro e 6 de outubro, o que significa que Portugal é o único país da Europa com duas competições do WSL, com a importância que isso tem para a imagem do país.

A edição deste ano foi bastante agitada e prolongou-se até ao último dia de espera (16 de março). Não faltou sequer uma tempestade que obrigou a deslocar a prova para o Molhe Leste para apanhar um swell (ondulação) favorável. Depois de vários avanços e recuos, a organização apostou tudo no swell de sábado e conseguiu terminar o Meo Rip Curl Pro Portugal em grande estilo, com o norte-americano Griffin Colapinto e a francesa Johanne Defay a mostrarem a dimensão do seu surf e a vencerem a competição. O triunfo de Colapinto é ainda mais relevante se tivermos em conta que foi penalizado na primeira bateria por não ter respeitado uma prioridade e ter ido parar às repescagens.

As finais deixaram bem claro que a nova geração do surf mundial atingiu a maturidade necessária para vencer competições deixando pelo caminho nomes como Gabriel Medina, tricampeão mundial, e Tyler Wright, bicampeã do mundo. A final feminina foi prejudicada pela ausência de boas ondas, o que explica as baixas pontuações. O mar mudou no heat (bateria de competição) decisivo da prova masculina e quem queria ver bons tubos ficou deliciado quando Colapinto descobriu duas ondas que deram excelentes tubos, um deles mereceu a melhor nota do evento; 9,67 pontos em 10 possíveis. Com este triunfo Colapinto lidera o ranking mundial e Defay é segunda classificada na variante feminina. De salientar que o prize money da prova era de um milhão de euros e os vencedores masculino e feminino receberam 74 mil euros cada, ou seja, na WSL não há diferença nos prémios entre homens e mulheres.

Onda de energia

A onda de Peniche, com cerca de três metros de altura, permite fazer um surf de alta performance, com manobras aéreas e extensos tubos a velocidades incríveis. Em pouco tempo ficou conhecida por supertubos ou pipeline europeu, pois é semelhante à onda pipeline do Hawai – considerada a onda rainha do surf.

Desde 2009 que é um desafio para os melhores do mundo, que não poupam elogios. John John Florence considerou que «as ondas são incríveis e o apoio das pessoas também». «A onda tem muita energia, faz-me lembrar um pouco o Havai, é um dos melhores beach breaks que existe. As ondas podem ser um sonho ou um pesadelo», frisou. Já o japonês Kanoa Igarashi, que vive na Ericeira, num português perfeito, afirmou: «Portugal tem as melhores ondas do mundo. Não sou só eu que digo isso, há muitos surfistas a dizer o mesmo. Todos querem competir em Peniche pela variedade de ondas, onde se pode fazer tubos e aéreos».

A edição deste ano foi menos espetacular – a praia de Supertubos tem potencial para muito mais – devido às condições adversas do tempo e do mar, por essa razão não houve qualquer nota máxima (10). O primeiro dia foi o mais completo com um bom swell e pudemos ver os surfistas a deslizar pela parede da onda, executar excitantes manobras aéreas e entrar pelos famosos tubos, conseguindo pontuações elevadas em heats muito disputados. Depois vieram ondas de menor dimensão e ventos on shore (ventos que sopram do mar para terra) e a prova teve duas interrupções prolongadas, só no último dia foi possível retomar a competição em bom estilo. A organização andou com a “casa às costas” algumas centenas de metros até à praia do Molhe Leste para continuar a competição, e depois voltou ao palco natural na praia de Supertubos. Essa mudança só foi possível porque a prova portuguesa é um evento móvel, é o único no circuito mundial com essa característica. Uma equipa com cerca de 1.500 pessoas trabalhou na realização da prova, que custa 3,5 milhões de euros e tem um impacto financeiro superior a 10 milhões de euros.

Os surfistas portugueses tiveram uma presença discreta na terceira etapa do WSL. Frederico Morais venceu o primeiro heat, mas foi eliminado na ronda seguinte. «É sempre difícil perder em casa, fiz um bom heat com aquilo que tinha. Umas vezes ganhamos, outras perdemos, desta vez não foi o meu dia», admitiu. Não está a ser um ano fácil para o surfista português, que ocupa o 22.º posto no Championship Tour; foi 17.º lugar no Lexus Pipe Pro, 9.º em Sunset Beach Pro e 17.º na prova portuguesa. Nas próximas duas etapas, na Austrália, tem obrigatoriamente de obter bons resultados para conseguir uma pontuação que o mantenha acima do cut a meio da época e evitar a eliminação. «São duas provas que gosto e em sítios onde me sinto bem. É ir com tudo e acreditar que vai correr bem. Espero que na Austrália consiga manter-me no CT», disse.

Os campeões nacionais Joaquim Chaves e Francisca Veselko estrearam-se no Championship Tour com o wildcard da organização. Concretizaram um sonho, mas não surpreenderam. Fica a experiência de surfar ao lado dos seus ídolos e a vontade de trabalhar mais e melhor para conquistarem um lugar na elite do surf. Joaquim Chaves foi eliminado na repescagem, mas ficou a experiência. «Competir no Championship Tour é um dos momentos mais importantes da minha carreira», afirmou. Francisca Veselko cumpriu o sonho de participar numa prova do circuito mundial. «Foi incrível, nas primeiras ondas nem consegui sentir as pernas, estava nervosa, mas é um medo bom. Fiquei um bocadinho frustrada, pois tinha mais para dar. Mas ainda assim deu para sentir o que é estar no CT. É aqui que quero estar», afirmou a campeã mundial júnior de 2022. A grande surpresa acabou por ser a presença de Matias Canhoto na primeira ronda. O jovem de 17 anos soube na véspera da prova que ia substituir Kelly Slater (campeão do mundo por 11 vezes), ausente por lesão. O surfista de Peniche foi eliminado na terceira bateria, tal como Kikas Morais, e terminou no 17.º lugar. «Estava a jantar quando o Francisco Spínola me ligou a dizer que havia a possibilidade de entrar no campeonato. Já nem consegui acabar de jantar, os nervos começaram a correr, quase não consegui dormir. É uma honra competir com estes surfistas em casa. Isto é a mesma coisa que estar num jogo de futebol com o Messi e o Ronaldo. É um sonho, foi a melhor coisa que já me aconteceu na vida», fez questão de salientar.