Tamborileiros da raia nordestina em risco de extinção

A raia nordestina alberga uma forma única da expressão da música tradicional, que corre um “sério” risco de desaparecer: a protagonizada pelo secular tamborileiro, uma espécie de músico “dois em um”.

o tamborileiro é um instrumentista que executa coordenadamente dois instrumentos musicais, a flauta pastoril e um tamboril. tocados em simultâneo, acabam por se “fundir” num só “provocando uma sonoridade única”, dividida entre a parte rítmica (tamboril) e a parte melódica (flauta).

“com o desaparecimento da actividade da pastorícia e com a melhoria das condições económicas das gentes da terra, os tamborileiros depressa adquiram outros instrumentos de sopro mais elaborados, como é caso da gaita-de-foles, ficando para trás a rudimentar flauta de três orifícios”, disse hoje à lusa o director do centro de musica tradicional sons da terra, mário correia.

para o também investigador, a tradição dos tamborileiros está no limite do “desvanecimento”, podendo provocar o desaparecimento.

os últimos dos tamborileiros da raia podem ser encontrados na pequena aldeia de constantim e freixiosa, no concelho fronteiriço de miranda da douro. deslocam-se um pouco por todo país e pela região, em particular, para dar a conhecer estes instrumentos.

aureliano ribeiro, de 75 anos, ângelo arribas, de 77, e célio pires, de 37, são os guardiães da sabedoria popular no que concerne à mestria de tocar flauta pastoril e tamboril por terras raianas do planalto mirandês.

“como tamborileiro, já percorri os quatro cantos do mundo passando pela índia, macau, marrocos, brasil, frança e em breve vou ao barém”, destacou ângelo arribas.

já aureliano ribeiro, considerado um mestre nestas melodias, garante que desde muito cedo começou a tocar flauta pastoril, incentivado pela família, que lhe incutiu o gosto pelo cancioneiro popular mirandês.

agora, cabe a célio pires dar continuidade a este tipo de instrumentista, uma vez que, para além de ser considerado pelos seus pares “como um brilhante executante”, é um construtor de instrumentos de “excelência”.

apesar de rudimentares, estes dois instrumentos requerem “prática e conhecimentos”, já que nem todos os músicos que os executam de forma “coordenada”.

a tradição era a de estes músicos dividirem a sua actividade musical em duas partes.

durante o ciclo pastoril tocavam apenas a flauta por ser um instrumento melodioso que não assustava o gado.

já num ambiente mais festivo, era-lhe associado o tamboril, que provocava um ritmo mais intenso e alegre, o que permitia danças de roda, ou a exibição dos tradicionais pauliteiros mirandeses.

para além da região nordestina, há outra zona do país onde ainda resistem alguns tamborileiros: a localidade de vila verde de ficalho, no concelho alentejano de serpa.

lusa/ sol