William Breathes: O primeiro crítico de canábis

A cor é intensa, o odor aveludado e o paladar apresenta tons de picante. A linguagem parece saída de uma pitoresca prova de vinhos, mas pode ser aplicada tal e qual à profissão do norte-americano William Breathes. Ele é o primeiro crítico de canábis e trabalha numa revista alternativa com artigos só sobre a planta,…

para um apreciador de marijuana, melhor que fumá-la só mesmo ser pago para o fazer. tal sorte não existe, dirão já os apreciadores mais cépticos; é inadmissível, dirão os detractores desta prática. mas há quem seja mesmo pago para fumar o seu cigarrinho de erva ou de haxixe.

nos eua – onde mais poderia ser? –, à boleia de dois momentos-charneira na história das leis em relação a esta droga leve, no colorado, um certo william breathes (o nome é obviamente fictício: o apelido significa, ironicamente, ‘respira’) é o único crítico de marijuana ‘profissional’ no país e talvez no mundo. mas que boleia foi essa? o colorado foi notícia ao aprovar, em novembro do ano passado, o uso recreativo da canábis, a planta que está na base da nossa história. antes, em 2009, já o havia feito em relação ao uso medicinal da planta.

a actividade de breathes vem dessa época. há muito um admirador e apreciador da planta, decidiu criar um blogue onde se dedicava à actividade de fumar e depois exprimir as sensações dadas pelo ‘charro’ consumido. a ideia era simples: “se formos apaixonados pela canábis e quisermos falar sobre ela, devemos criar um blogue sobre o que fumamos e o efeito que produz em nós”, explica ele à revista francesa les inrockuptibles. “e quando a canábis for legalizada, poderemos dizer: eu contribuí para isso”.

orgulhoso do seu feito, acabou por candidatar-se ao lugar de repórter e crítico da especialidade na underword, uma revista ‘alternativa’ de denver, uma das principais cidades do colorado. entre mais de 300 candidatos para o posto, breathes foi eleito, tendo como arma a sua larga experiência como crítico e blogueiro. mas ainda hoje prefere resguardar a sua identidade, escondendo-se atrás de uns óculos escuros e recusando divulgar o seu nome verdadeiro. a discrição é tanta que até a família foi apanhada de surpresa. “os pais da minha mulher não sabiam. descobriram um dia, quando apareci na cnn há alguns anos”, conta breathes.

quanto às críticas, elas são, quanto ao léxico, dignas de um provador de vinhos. a linguagem técnica mostra a especialização do crítico, que o eleva quase a alguém que analisa uma obra de arte: “o odor e o gosto são muito sensoriais, como a canábis da ásia, muito forte, muito metálica e até um pouco apimentada quando se aspira o fumo”, escreveu acerca de uma certa variedade da famosa planta. o método de trabalho é simples. no princípio da semana, o jornalista inicia as provas. até quinta-feira, dia de fecho de edição da underword, breathes já tem uma ideia preparada para os seus textos.

perguntas frequentes

mas é claro que william breathes não esgota aqui o seu trabalho. ele parte semanalmente pelo estado para recolher histórias para a sua secção na revista. a maior parte das reportagens dizem respeito aos fins medicinais da planta, há muito praticados à luz do dia e com enquadramento legal e sanitário no colorado. além disso, breathes mantém uma coluna de perguntas frequentes, em que desfaz mitos e esclarece dúvidas, como por exemplo a possibilidade de ‘clonar’ canábis.

a actividade promete, entretanto, ser florescente. com a legalização tão recente, breathes em breve terá colegas de profissão a fazer-lhe concorrência na imprensa convencional do estado e talvez até da união. espera-se a abertura de milhares de coffee shops e uma actividade já bastante próspera em janeiro de 2014.

ricardo.nabais@sol.pt