Juízes concluíram que Manuel Abrantes deu protecção a Carlos Silvino

Os juízes do processo Casa Pia concluíram que o ex-provedor adjunto Manuel Abrantes protegeu o ex-motorista da instituição Carlos Silvino, que teve liberdade e impunidade para praticar abusos sexuais com menores casapianos 

No acórdão final, a que a Agência Lusa teve acesso, o colectivo
considerou que existiu uma relação «diferente» entre os
dois arguidos, ambos condenados por abuso sexual de menores, que levou a
concluir que houve «uma situação de protecção» do
ex-provedor ao seu funcionário.

Ao longo dos anos em que trabalhou na instituição, Carlos Silvino
teve várias «sanções disciplinares e advertências», mas
ao mesmo tempo foi progredindo na carreira e sendo promovido, «criando um sentimento de superioridade e impunidade».

Baseando-se nos relatos de várias testemunhas que trabalharam na
Casa Pia, os juízes entenderam que, «objectivamente, havia
uma especial relação entre o arguido Carlos Silvino e o arguido Manuel
Abrantes»
, culminando numa «atitude de protecção» do
ex-provedor em relação ao ex-motorista, que «tinha atitudes
que demonstravam ascendente e poder face aos demais funcionários»
.

Além disso, os relatos das testemunhas indicam que, apesar da
diferença de estatuto entre os dois, Carlos Silvino tratava às vezes
Manuel Abrantes «com arrogância e desrespeito, pondo em
causa publicamente a sua autoridade»
sem recear «sanção
ou recriminação»
.

Por seu lado, Carlos Silvino pôde «movimentar-se no
interior da Casa Pia de Lisboa como quis»
, destacam os juízes.

Manuel Abrantes demonstrou «tolerância» para com Carlos Silvino e
permitiu-lhe «dispor, sem preocupação, do tempo durante o
período de serviço ou dos veículos da Casa Pia»
para abusar ou
permitir que outros arguidos abusassem de alunos.

Enquanto dirigente da Casa Pia e instrutor de processos
disciplinares ao ex-motorista, Manuel Abrantes «desvalorizou
e desconsiderou»
o risco que a manutenção ao serviço de Carlos
Silvino trazia ao «crescimento, saúde e formação» dos
alunos da instituição.

Manuel Abrantes alegou em tribunal não saber das acusações de abuso
sexual imputadas a Carlos Silvino no âmbito dos processos disciplinares
e não ter responsabilidades directas nos cargos que o ex-motorista ia
exercendo, mas os juízes não entenderam assim, argumentando que desde
1984 que Manuel Abrantes conhecia Silvino, «as funções que
exercia e como as exercia»
.

Em relação a um dos processos disciplinares, que correu em 1989 e
que levou à demissão compulsiva de Carlos Silvino, «não é
crível»
que Manuel Abrantes não soubesse os motivos do processo, em
que já se imputavam abusos sexuais ao ex-motorista.

No fim do julgamento, Carlos Silvino foi condenado a 18 anos de
prisão efectiva pela prática de abuso sexual de menores dependentes,
abuso sexual de pessoa internada, violação e pornografia de menores,
enquanto Manuel Abrantes foi condenado por 2 crimes de abuso sexual de
menores dependentes e abuso sexual de pessoa internada a cinco anos e
nove meses de prisão.

O acórdão deste julgamento foi proferido no dia 03 deste mês na 8.ª
Vara Criminal, no Campus de Justiça de Lisboa, mas só hoje foi entregue
aos advogados, após vários adiamentos.

Lusa/SOL