Batalha naval

Descemos o rio Minho, o único na Península Ibérica que permite fazer rafting o ano inteiro, na companhia da Melgaço Radical. Sem medos.

bigode farto, arcaboiço imponente, voz cavernosa, anselmo dantas não disfarça o passado como sargento da marinha de guerra portuguesa. a postura do presidente e guia da melgaço radical, empresa de desportos radicais do concelho de melgaço, alto minho, fez-nos antever uma autêntica prova de destreza militar. afinal, foi dessa forma que nasceu o rafting no rio colorado, estados unidos, nos anos 30.

cobertos da cabeça aos pés pelos fatos isotérmicos de neoprene, as botinas de borracha, os coletes salva-vidas e os capacetes de protecção, escutámos com atenção as regras do jogo. simples: prender os pés nos ‘cintos de segurança’ – as foot straps -, remar quando nos for mandado (pelo monitor que dirige cada embarcação) e não ter medo de inclinar as costas para trás, pois ao contrário do que parece, esta posição evita que o barco vire nos rápidos.

«posto isto, está na hora do baptismo», exclamou o monitor. sorriso matreiro a deixar cair a máscara, deu-nos uma valente molha antes de entrarmos para os rafts (barcos pneumáticos). só para resfriar os receios. «a partir deste momento não há superiores nem subordinados, tratamo-nos todos por ‘tu’» e «todos os que estão no outro barco são nossos inimigos», estava dado o mote para as ‘batalhas navais’ que se seguiram, cujo objectivo era encharcar o adversário.

a distância a percorrer depende do caudal do rio minho: se cheio, são 18 quilómetros; se reduzido, apenas dez. «a maioria dos rios seca no verão, este é o único na península ibérica cujo caudal permite praticar a actividade todo o ano», explica anselmo. é esta a razão para melgaço envergar o título de capital ibérica do rafting.

e afinal não havia motivos para temer a descida, iniciada na fronteiriça província de ourense, em espanha: numa escala de seis, o rio minho tem o grau três, correspondente ao nível de iniciação no rafting. «no verão até aceitamos crianças a partir dos dez anos, já vi três gerações – avós, filhos e netos – a descer o rio ao mesmo tempo», comentou o guia.

o caudal estava tão suave que, a meio do passeio, pudemos deixar o barco e tomar banho no rio, deixando-nos levar pela corrente. nas margens, o verde cerrado das encostas e o património das pesqueiras (mais de 500 muros graníticos milenares, colocados estrategicamente para a pesca da lampreia, do sável e do salmão). à frente, o infinito horizonte do curso de água, que nasce nos montes cantábricos e desagua em caminha, pontilhado aqui e ali por garças cinzentas. a cruzar o céu, uma águia real.

a experiência, organizada em parceria com o hotel monte prado, ainda não acabara e já pensávamos na próxima. agendámos mentalmente um dos percursos esporádicos marcados para noites de lua cheia. segundo anselmo, nestes «o sossego é tal que até se ouve o coaxar das rãs».

aisha.rahim@sol.pt

melgaço radical
tel. 251 402 155/ 967 006 347; www.melgacoradical.com
€30 (inclui visita cultural à vila de melgaço)