O país está de tango

Ultrapassaram as quatro paredes das escolas de tango e fizeram da dança argentina um motivo para sair à noite. Todas as quartas-feiras há bailes com entrada livre nas ruas da capital .

a rosa na boca e o vestido vermelho a matar, fique claro, não são para aqui chamados. «a imagem apaixonada de piruetas, facas e alguidar corresponde ao tango show e não às milongas», esclarece patrícia stretch, percorrendo com o olhar os primeiros pares a estrear a pista. basta observá-los para perceber a afirmação da arquitecta de 39 anos – os casais deslizam singelos, de olhos fechados, num abraço delicado.

«’o tango é um romance de três minutos’, como disse o tangueiro carlos gavito: um diálogo intenso entre pés e mãos, um conduz e o outro lê», continua alexandra rua, advogada, passando a palavra, com um sorriso cúmplice, a uma terceira colega. é que para manuela barbosa, 65 anos, o romance não se ficou pelos três minutos: «estava a passar por uma fase particularmente difícil e tive a sorte de encontrar o meu actual companheiro há três anos nas milongas».

patrícia, alexandra e manuela fazem parte dos tango na rua (tnr), um pequeno grupo que organiza milongas, bailes sociais, todas as quartas-feiras à noite, em lisboa, e divulga as de outros através do blogue tangonarua.blogspot.com. «este tipo de milongas acontece em todo o mundo. quando viajamos procuramos na internet, os estrangeiros fazem o mesmo quando vêm: chegam, mudam de sapatos, dançam e vão-se embora», conta manuela.

o objectivo é reunir a comunidade tangueira e desafiar os que ainda não experimentaram a dança argentina. a entrada é livre e qualquer pessoa é convidada a juntar-se, mas manuela adverte que o tango «é difícil, tem passos específicos e não basta gostar mesmo, é preciso ter a humildade de aprender». há regras básicas que os leigos desconhecem – como as de que o tango se dança ao redor da pista e no sentido contrário aos ponteiros do relógio – e patrícia aconselha os inexperientes a terem primeiro uma aula.

estamos no miradouro portas do sol, com vista para o bairro de alfama e a iluminada margem sul do outro lado do tejo. mas as milongas dos tnr também acontecem noutros «lugares com alma» – assim lhes chama patrícia – como o padrão dos descobrimentos, onde já bailaram numa mística noite de nevoeiro, ou a castiça colectividade tejolense atlético clube, em alfama, com cheirinho a bifanas e azulejos brancos como pano de fundo.

o chão quer-se deslizante q.b., mas se não estiver no ponto «espalha-se pó de talco e está feito». a bem dos vertiginosos sapatos de tango, «que são caros como o diabo» mas «ajudam à postura» e «dão feminilidade e glamour» à mulher.

sobre os tnr, que quando começaram há quase quatro anos apenas tinham um leitor portátil a pilhas e hoje já contam esporadicamente com música ao vivo, ilídio varandas, outro membro do grupo, lança o repto: «no facebook os tnr têm 1.149 amigos, nem todos dançam mas quem sabe um dia…».

aisha.rahim@sol.pt

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