O empecilho doméstico

A maior parte passou da casa da mãezinha para a vida de casado, esperando que a mulherzinha também descasque a pele das castanhas para fazer puré.

há homens bons, homens maus e homens que não prestam para nada.

há tipos sem espinha dorsal, sem bom nem mau carácter, os tais que não prestam para nada. e, dentro desta subespécie, existe ainda uma raça pior, a daqueles que, fazendo vários disparates fora de portas, ainda se revelam um peso morto dentro das mesmas. chamo-lhe os ‘empecilhos domésticos’, seres de total inutilidade para a vida quotidiana, que se comportam como débeis mentais no habitat do lar, considerando que, lá por serem machos, não têm de mexer um dedo no território onde julgam reinar.

caro leitor, se acha que meter a loiça na máquina é tarefa de mulher, que pôr a mesa não é digno do seu estatuto e que passar uma camisa é uma afronta à sua integridade, se não sabe mudar uma lâmpada, arranjar um candeeiro ou pendurar um quadro, e não leva o lixo, não passeia o cão nem muda a areia ao gato, se protesta porque as meias estão mal dobradas e porque a sopa está insossa, sem no entanto dar um minuto do seu dia para ajudar a senhora com quem vive, se não sabe cozinhar, se nunca mudou uma fralda aos filhos e é dos que nunca se levanta de noite para lhes ir pôr a chucha, então aconselho-o a não me cumprimentar, caso nos cruzemos na rua, pois aviso-o desde já que, com orçamento ou sem orçamento, terá de se haver comigo.

pior do que um homem que não sabe fazer nada fora de casa é um tipo que em casa não faz absolutamente nada, criando um peso terrível para a mulher com quem vive.

e, mesmo que no quadro doméstico exista uma mulher a dias ou empregada interna, há que perceber que uma pessoa que quer ser respeitada tem de se dar ao respeito e mostrar alguma dignidade. um homem tem de saber ajudar: se não gosta de lavar a loiça, então que cozinhe ou trate dos cães ou se encarregue da manutenção do lar. se não sabe coser um botão ou estender a roupa, então que dê banho às crianças. os estrangeiros ocidentais, com excepção dos latinos, sabem todos fazer imensas coisas – por que é que os ‘tugas’ não sabem?

a resposta é simples e, infelizmente, demonstra que a culpa é das mulheres. é que a rapaziada nunca cortou o cordão umbilical. a maior parte passou da casa da mãezinha para a vida de casado, esperando que a mulherzinha também descasque a pele das castanhas para fazer puré. são meninos da mamã que chegam à idade adulta com aptidões equivalentes às de um bebé de colo, mas sem os seus encantos.

é preciso fazer tudo por eles. e, quando uma pessoa se vê na contingência de ter de fazer tudo por outra, quando chega a hora do bem-bom, é natural que já não lhe apeteça fazer nada.

pondo as coisas de outra forma e para que não seja acusada de feminista furiosa e parcial, pergunto então: gostam os cavalheiros em geral de ter em casa uma donzela ou senhora que não saiba fazer absolutamente nada? que não saiba cozinhar, não mude os lençóis da cama e nem sequer limpe o pó?

pois. tenho razão, não tenho?