quantos mais anos vivemos, mais ouvimos as promessas do costume nesta época de fim de ano e início de outro. ‘vou deixar de fumar’, ‘vou ter mais cuidado com a alimentação’, ‘vou passar a andar a pé todos os dias’, ‘o carro vai passar a ficar na garagem durante a semana’, ‘vou ser mais poupado’, ‘vou ser mãe’, ‘vou deixar de colocar o trabalho à frente de tudo’, ou tão simplesmente ‘vou ter mais tempo para mim’. pequenos desejos que ouvimos da boca de muito boa gente, convencida de que o segredo é aproveitar o ano novo para mudar pequenas grandes coisas na vida. como se o fim de um ano e o início de outro fosse mais que uma folha caída no calendário. só que por uma razão pouco racional gostamos de acreditar que a tal passagem de ano, o fim do velho e o surgimento do novo, é o anunciar de uma nova realidade que queremos associar a coisas boas ou que ambicionamos há muito.
também é por esta altura que chovem emails no computador com mensagens apelando ao nosso lado mais solidário e recordando-nos que se ficarmos doentes serão os amigos que irão ajudar-nos e não uma qualquer promoção ou tarefa profissional. nesta senda de mudança, há até quem acredite que quando soam as doze últimas badaladas, e ao mesmo tempo que vão engolindo as respectivas passas, os sonhos formulados acabarão por se concretizar. para os mais dados a superstições, nenhuma mulher ou namorada poderá começar o ano sem umas cuecas azul-turquesa, já que assim terão mais sorte. estranho este amuleto… não estará na altura de actualizar a cor?
na maior parte das vezes, ao fim de alguns meses constata-se que nada se alterou e que os desejos de mudança se esfumaram no frio dos dias de inverno. uns tratarão então de procurar ajuda, que poderá passar por aconselhamento médico ou pelo recurso a cartomantes e afins. outros irão ficar à espera do fim do ano para voltarem a repetir a mesma conversa, convictos de que no próximo ano é que será mesmo ‘à séria’.
penso que portugal é um pouco o espelho destes desejos nunca concretizados. um país que é dos mais desenvolvidos em inúmeras matérias – dos cartões de crédito às vias verdes, dos vinhos a toda uma agricultura biológica, do sistema de pagamento dos telemóveis às indústrias tecnológicas, não faltam exemplos de sucesso neste cantinho europeu. um país que tem homens nos cargos mais importantes da europa e do mundo. desde durão barroso a jorge sampaio, passando por antónio guterres e acabando em antónio horta osório, o ceo do lloyd’s banking group, há gente com capacidade para inverter o tradicional fadinho lusitano. que por uma ou outra razão acaba sempre na choramingueira habitual.
acredito que não somos obrigados a suportar esse maldito destino.
utilizando uma das máximas dos tais emails que nos são enviados por pessoas genuinamente amigas, diria que está nas nossas mãos alterar o caminho que segue na direcção do abismo. podemos e devemos não dar um passo em frente e caminhar numa direcção segura. repare-se no que se passou com a nossa selecção nacional de futebol. carlos queiroz conseguiu transformar um conjunto de excelentes jogadores num grupo de rapazes sem alegria e sem qualquer chama. com ele, caminhávamos alegremente para o abismo. desde que alguém teve a lucidez de o enviar para a bancada, portugal não deixou de ganhar jogos, tendo mesmo humilhado a espanha, actual campeã do mundo.
foi um gesto simples que não precisou de aguardar por ano novo, nem por mão divina.
o futuro do país passa inevitavelmente por aproveitar os seus melhores cérebros. é preciso estancar a emigração desses ‘cromos’ que fogem deste canto fatalista e vão enriquecer os países de destino. é um facto que há matéria-prima de qualidade para fazer de portugal um país com melhores condições, sendo apenas necessário dar-lhes oportunidade de o demonstrarem. há até quem diga que se o país conseguisse patentear todas as invenções que os portugueses descobrem, seria uma nação bem mais rica e sem o credo de bancarrotas.
que em 2011 possam concretizar todos os vossos desejos são os meus votos. feliz ano novo.