‘Até parece que o Bibi é o coitadinho’ [com vídeo

André é cúmplice na revolta. «Nos últimos dias, acordo três vezes por noite. Tenho tomado uns comprimidos para dormir melhor. Estou na Faculdade, tenho exames à porta e não consigo estudar. Passo os dias a ler tudo o que tem a ver com a Casa Pia, até comentários publicados em sites e blogues. De repente,…

a vida de andré foi espinhosa desde o berço. órfão de pai, abandonado pela mãe, andré recorda-se de caminhar sujo para a escola e com um aperto no estômago. levava dias seguidos a comer atum com cebola, ele e os irmãos mais velhos que já tinham entrado no mundo dos pedófilos cadastrados.

entrou no colégio maria pia e aí cruzou-se com carlos silvino, que o levava a ver jogos de futebol mas nunca abusou dele. até ao dia em que um dos sete irmãos o aliciou, a troco de refeição mais substancial, a jantar com michael burridge, o professor de inglês condenado num processo em oeiras por actos homossexuais com adolescentes.

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a partir desse momento, andré entrou na mesma roda e assim conheceu o embaixador jorge ritto. passou a andar de casa para casa como mais um troféu da rede de abusadores. alguns nunca conseguiu identificar, apesar de ter quase a certeza de que uma das pessoas referenciadas no processo, que não chegou a ser constituída arguida, fazer parte da lista de homens que acabaram com a sua inocência: «mostraram-me fotos, várias, era muito parecido com um certo político, mas eu não tinha a certeza absoluta e não queria ficar com problemas de consciência».

recorda que andava enojado e que tentou escapar das malhas do grupo. passou a refugiar-se no lar e deixou de ir a casa para evitar a pressão dos próprios irmãos. mais tarde, contaria à pj o que eles não tiveram coragem de denunciar. hoje com 24 anos, o estudante universitário – que há cinco anos ficou com 15% de incapacidade, por conta de um violento acidente quando era conduzido para o emprego no carro do seu segurança pessoal – continua às voltas com o destino.

esta semana, ao ver carlos silvino no ecrã da televisão, foi como se estivessem, de novo, a arrancar-lhe a ferros a coragem que o fez, com outras testemunhas, denunciar as décadas de abusos na casa pia: «como é possível fazer aquilo contra nós, que já sofremos estes anos todos e nunca mais conseguimos endireitar a nossa vida? fez o papel que qualquer pedófilo faz, porque o pedófilo diz logo que não quando é confrontado».

felicia.cabrita@sol.pt