há uns anos, li um artigo de opinião que me acompanha desde então. nuno brederode santos, um cronista que usava a ironia com mestria, relatava o inferno que se tinha tornado o almoço/jantar com amigos e conhecidos. dizia ele, mais coisa menos coisa, que era impossível almoçar com alguém a sós, já que o conviva de ocasião tinha deixado de ir sozinho, pois fazia-se sempre acompanhar por um aparelho esquisito que ora tocava, ora servia de máquina de escrever. era impossível, escrevia ele, ter um repasto simpático sem ser interrompido por tal aparelho. falava, obviamente, do telemóvel. as pessoas, regra geral, passaram a ser tão dependentes do telefone portátil que parece que a vida se tornou impossível sem tal objecto. acredito que há uma certa classe que não pode ou não deve prescindir de tal adereço. têm negócios inadiáveis, precisam de estar disponíveis a toda a hora para os funcionários ou há quem dependa deles por razões de saúde ou de outra ordem. são muitos os que estão nessa situação, mas o que se constata é que a moda se generalizou de tal forma que hoje em dia não há almoço onde não existam telemóveis em cima da mesa ou os inovadores ipad. não sou diferente, e em muitas ocasiões, infelizmente, tenho que o ter próximo. mas existe uma tecla que permite pô-lo no silêncio ou em modo que se dê por ele quando toca.
com o avanço das tecnologias, as pessoas em vez de ganharem tempo para si, tornaram-se dependentes das comunicações. estou em crer que os ipad se transformaram no último adereço das mesas de refeição, tal o orgulho com que o colocam em cima do tampo que serve, supostamente, para albergar pratos e copos.
mas o mais impressionante é que as pessoas parece que ficaram mais distantes com os aparelhos que os aproximam geograficamente dos outros. em vez de se falar directamente, mandam-se sms ou emails. seja para desejar um feliz aniversário ou para dar os parabéns por alguma conquista. os sentimentos passaram a ter forma de telemóvel ou computador portátil. não será difícil perceber que há verdadeiros obcecados com tais objectos. por dia, recebo dezenas, às vezes centenas, de emails de pessoas que nada mais devem fazer na vida. a obsessão é tal que, segundo uma reportagem televisiva, há quem não prescinda de levar o telemóvel para a casa de banho. como se o mundo não pudesse esperar cinco minutos. não se trata de demonizar os telefones e computadores portáteis. hoje em dia são imprescindíveis e o mundo está melhor, em alguns aspectos, do que no passado. veja-se a utilidade para convocar manifestações de protesto ou de outra ordem. mas será que tudo passou a ser um caso de vida ou de morte para não se deixar o telélé descansado um pouco? não me parece.
vitor.rainho@sol.pt