Nas Bocas do Mundo – Laurent Gbagbo

A sua arte de negociante fermentou ao ponto de ser chamado nos círculos políticos africanos de Le boulanger (o padeiro), graças à expressão francesa Rouler quelq’un dans la farine (enrolar em farinha, ou seja, intrujar).

A ironia da História (a sua formação), porém, pode fazer com que Laurent Gbagbo fique para a posteridade como um panado ou um croquete. Presidente desde 2000 da Costa do Marfim, enfrentou uma guerra civil em 2002, quando Alassane Ouattara – o vencedor das eleições presidenciais de 28 de Novembro último – foi impedido de concorrer porque o pai era natural do vizinho Burkina Faso. Desde então, agarrou-se ao poder como uma lapa e esqueceu-se, até há meses, de que não tinha mandato para dirigir o país desde 2005.

O líder marfinense acedeu no ano passado à realização de eleições mas, a avaliar pela sua reacção, já se terá arrependido. Perdeu na segunda volta por 375 mil votos (numa percentagem de quase 9%), mas não aceitou em momento algum o veredicto dos compatriotas. Isolado pelas instâncias internacionais, persistiu em ficar com a mão na massa, lutou contra os apoiantes do vencedor das eleições e sitiou-o. Mas os ventos da História não estão de feição para os regimes autoritários e, tarde ou cedo, a CEDEAO (Comunidade de países de África Ocidental), a ONU e a França, antigo colonizador, apoiaram decisivamente o avanço das tropas próximas do vencedor das eleições.

Há quem argumente que foi graças ao novo mandato da ONU que Gbagbo perdeu; porém, o ‘padeiro’ – qual pão-duro que tranca o acesso à farinha – traçou o destino quando defendeu a sua vontade contra a da maioria.