A festa cósmica de Sufjan Stevens

Já se sabia que Sufjan Stevens está diferente musicalmente. Já se sabia que o concerto em Lisboa, no Coliseu dos Recreios, seria focado no mais recente The Age of Adz, em vez do consensual Illinoise, de 2005. Já se sabia que aqueles que tiveram oportunidade de o ver por cá há sete anos, no Festival…

os relatos e as centenas de vídeos no youtube, que nos foram chegando durante os últimos meses, anteciparam o ambiente psicadélico, fluorescente e extrovertido do espectáculo. mas a experiência de assistir ao vivo a sufjan stevens, e à viagem ao centro do cosmos que se propôs fazer com a digressão que ontem terminou em lisboa, transcendeu qualquer descrição prévia.

num espectáculo extremamente visual, e muito bem concebido, a nova vida artística de sufjan ganha todo o sentido. ao vivo, o lado conceptual de the age of adz é sustentado por uma vivacidade teatral muito forte, assente não só na roupa futurista das 11 pessoas em palco (incluindo sufjan, os músicos e duas bailarinas), mas também nas constantes animações visuais projectadas numa tela gigante no fundo do palco.

o início do concerto, com o velhinho ‘seven swans’, apresentou logo o lado metafísico do concerto e, naturalmente, do próprio sufjan – que apareceu em palco com umas asas gigantes, a lembrar um anjo caído. apesar da canção ser da era folk directa e sincera, sufjan conseguiu combiná-lo com a excentricidade que agora apregoa nesta reinvenção «melodramática, bipolar, hormonal e psicótica», como o próprio a descreveu.

«vamos celebrar o amor, o apocalipse e a solidão», referiu sufjan na primeira vez que se dirigiu ao público, agradecendo a presença de todos na viagem «através desta nave espacial», com o cenário do coliseu dos recreios a servir, de facto, como palco de excelência para a descolagem rumo ao espaço.

durante cerca de duas horas de espectáculo, sufjan alternou as canções de age of adz com temas mais antigos (essencialmente dos álbuns seven swans e michigan), numa esquizofrenia necessária para «limpar um pouco o ar» neurótico das novas canções. depois fez questão de explicar a influência que o pintor autoproclamado profeta royal robertson tem no novo trabalho, onde tentou alcançar «a transcendência» através apenas do som, e não das canções como o fez no anterior illinoise.

depois de uma hora e quarenta minutos, sufjan despediu-se do público lisboeta com o longuíssimo ‘impossible soul’, canção de 25 minutos, mudando a vestimenta cósmica por uma bastante mais infantil, cheia de balões. voltou cerca de dez minutos depois com nova indumentária.

sozinho, de t-shirt com a ilustração de um coração e calças de ganga, sufjan visitou, pela primeira vez em toda a noite, illinoise. ‘concerning the ufo sighting near highland, illinois’, ‘casimir pulaski day’ e, por fim, ‘chicago’ foram as três canções escolhidas para o encore. às primeiras notas de ‘chicago’ caíram dos céus balões coloridos, culminando o espectáculo que durante duas horas e vinte minutos transformou o coliseu dos recreios numa nave espacial, numa verdadeira festa cósmica. e nem foram preciso pastilhas.

alexandra.ho@sol.pt