Das Duas Uma

Bairrão acabou por não ser confirmado como secretário de Estado por, alegadamente, ser contra a privatização da RTP1.

bernardo bairrão, administrador da tvi, acabou por não ver confirmado o convite para secretário de estado por, alegadamente, ter defendido que seria um erro a privatização da rtp1. não me custa a crer. nem que bairrão tenha sido convidado (é competente); nem que entenda que a privatização seria um erro trágico (sabe do que fala); nem que o primeiro-ministro o tenha ‘desconvidado’ (a sua posição vai contra a do primeiro-ministro). mas, se assim foi, não deixa de ter sido um erro. porque bairrão tem razão, mesmo se a sua posição é ditada pelo legítimo receio de que, a concretizar-se, a decisão de passos coelho, além de baixar drasticamente a já tão baixa qualidade da programação dos canais generalistas em portugal e de diminuir significativamente os seus lucros, iria quase inevitavelmente arruinar um dos três. e esse canal bem poderia ser a tvi.

aparentemente, o primeiro-ministro terá percebido que a sua promessa era, no mínimo, discutível e deixou, por isso, de ser uma prioridade. não me admira que tenha sido aconselhado por alguns dos seus pares – sobretudo por morais sarmento que, no governo de durão barroso, também teve a mesma ideia – mas emendou a mão a tempo e acabou por ser o melhor ministro da tutela das últimas duas décadas. a verdade é que os problemas que passos coelho iria levantar seriam superiores aos que iria resolver. senão vejamos: 1. quem pagaria a dívida de mais de 700 milhões de euros da rtp1, uma vez que as suas receitas publicitárias estão comprometidas ao pagamento da dívida? quanto passariam a custar os outros canais e obrigações de serviço público (rtp2, açores e madeira, rtp áfrica e internacional, canais temáticos, etc., cujos conteúdos dependem em muito da rtp1)? como iria o ‘bolo publicitário’ (numa economia em recessão) poder assegurar o funcionamento de três canais comerciais ao aumentar a publicidade da rtp1 de seis para 12 minutos/hora? mais: para satisfazer alguns putativos candidatos, a medida iria criar graves problemas a balsemão (um dos fundadores do seu partido) e a pais do amaral, que não é propriamente um adversário político.

adiada para 2012, o governo tem tempo para recuar. mas, entretanto, porque não aproveitar estas tréguas para fazer uma reflexão séria sobre as perspectivas abertas pela convergência tecnológica da tv e das telecomunicações – tdt, hd, nova geração de telemóveis, pacotes de serviços (tv, net, telefone e telemóvel) –, e a sua incidência em portugal? de que estamos à espera para lançar as bases de uma verdadeira indústria de conteúdos? que medidas práticas deverão ser tomadas para estabelecer, de uma vez por todas, as bases de uma política da lusofonia nesta área, aproveitando o mercado de mais de 250 milhões de falantes lusófonos espalhados pelo mundo, e que, além de um elemento de afirmação cultural e de projecção de talentos, é uma preciosa alavanca de negócios e um instrumento de expansão da influência de portugal no mundo?

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