queria que fosse tudo novo, diferente, fresco e por isso mesmo puro. fui para estocolmo onde fiz couch-surfing em casa de uns amigos durante cinco dias.
viajar é óptimo, mas viajar sabendo que quando chegamos ao destino estamos em casa ainda é melhor. nunca percebi aquelas pessoas que vão viajar sozinhas, para se encontrarem, dizem. para mim, a companhia de bons amigos opera milagres no meu humor e na visão que tenho das coisas; eles conseguem ver-nos de longe e ajudar-nos a mudar a perspectiva que temos da realidade. os amigos são isto mesmo: pessoas para quem os nossos problemas têm a mesma dimensão do que para nós e que estão lá para nós sempre que é preciso.
e lá estavam eles, o happy couple à minha espera, de braços abertos. ele muito português, moreno, fumador, apreciador eclético de música, e ela muita loira, muito afável, muito executiva e muito sueca. a presença de um casal feliz em fases de solidão pode ser um bálsamo eficaz para um coração em fase de reconstrução; faz-nos lembrar que já fomos felizes e também que é possível viver assim, mesmo para os que acreditam mais no amor do que nas relações.
os casais felizes que conheço nem sempre estão contentes com a vida, mas já encontraram uma fórmula alquímica de entendimento que envolve respeito, estima, consideração, bonomia e sobretudo aceitação. quando uma relação se torna séria e consistente, há trabalho de casa todos os dias; é preciso dar-lhe tempo e espaço para respirar, aprender a ouvir e a respeitar no outro mesmo o que não entendemos – sobretudo o que não entendemos.
uma relação é sempre um processo de aprendizagem, mesmo quando pensamos que sabemos tudo. observar a dinâmica de casais dito felizes é uma forma de aprender, porque vemos nos outros o que somos, ou não, capazes de aplicar na vida.
afinal de contas, do que é que precisamos para sermos felizes com outra pessoa? precisamos antes de mais da sua companhia, porque um amor ausente não serve para nada. precisamos de entendimento e de paz, pois um amor conflituoso mata o amor. precisamos de solidariedade e de apoio. um amor que não vai à farmácia quando estamos doentes não merece o nosso amor por ele. precisamos que o outro dê o seu tempo, a sua logística, o seu carinho, porque um amor atarefado ou egoísta seca o próprio amor.
no fundo precisamos de simbiose: eu dou o que tenho de melhor e tu dás-me o que podes, ajudamo-nos um ao outro e juntos formamos uma boa equipa. eu vou à compras e tu despejas o lixo. eu pago a renda e tu pagas as contas. de preferência sem contar os trocos nem cobrar à outra parte o que ela não pode dar.
afinal de contas, o amor é muito mais prosaico do que a literatura e o cinema nos querem convencer. é feito do dia a dia, pequenos gestos que valem como grandes, porque já dizia o wilde que não há coisas grandes nem pequenas, todas são importantes. e a mais importante talvez seja ter a coragem de dizer ao outro que o amamos, apesar de tudo o que ainda não aprendemos a aceitar nele.