Outra dimensão

Há mais de cinco anos a escrever semanalmente sobre amor, relações e sexo nesta página e agora que o meu nono romance vai finalmente a caminho das máquinas impressoras, respiro profundamente e penso: ‘Afinal onde reside o amor?’.

o amor reside em toda a parte, mas sobretudo no coração dos que têm tempo para amar, que todos os dias se dão ao trabalho – que é um prazer – de o fazer, que sabem dar e receber, que vêem o mundo com bons olhos, que o respiram de dentro para fora e de fora para dentro.

há 16 anos senti a maior dose de amor de sempre a correr-me na veias, quando o meu filho nasceu. lembro-me de o ter ao peito e de pensar que o leite que ele bebia alimentava a minha vida. hoje ele tem quase 1,90 m, viaja sozinho, fala quatro línguas e tem amigos em todos os continentes, mas para mim ainda é o bebé que há 16 anos recebi nos braços. no dia do seu aniversário, fomos comprar livros e discos e no regresso a casa disse-lhe que talvez um dia ele pensasse em ter filhos, para poder um dia sentir o que eu sinto. espero que ele tenha ouvido.

a melhor maneira de nos fazermos ouvir junto dos filhos adolescentes é ouvi-los primeiro. eu não gosto dos green day, mas quando ele me quer mostrar a última música deles, eu oiço. e oiço as histórias da escola, as alcunhas menos simpáticas que ele cola às professoras, as queixas, os desabafos, oiço-o para que ele não desaprenda de me ouvir.

ser mãe de um adolescente é uma contínua, longa e, por vezes, árida lição de amor, porque obriga a uma grande resistência e a uma enorme humildade.

é importante aceitar que são seres humanos diferentes de nós, com vontade de fazer alguns disparates e pisar o risco só por pisar, tal e qual como nós, há 30 anos. ser mãe de um adolescente também é nunca desistir, nem deixar que ele desista. puxar por ele, mesmo que ele não queira ir, obrigá-lo a reconhecer o que a vida tem de bom mesmo quando ele se fecha no quarto, tirá-lo da concha e mostrar-lhe o mundo.

é o amor que comanda este processo. sem amor não há família que resista e nada substitui o valor inestimável e incalculável que é nascer numa família cheia de amor. eu tive essa sorte, lembro-me dela todos os dias e por isso tento replicar o meu modelo com os meus, e com os meus amigos que merecem fazer parte daquilo a que chamo a minha segunda família. e ao dar e receber amor todos os dias, vou ficando mais forte, mais serena e mais feliz.

antes de ser mãe já intuía isto, mas não o podia sentir, e por isso era uma pessoa mais triste, mais vazia e muito mais só, apesar de todo o amor que sempre me rodeou. foi o meu filho quem me transportou para outra dimensão, a do amor incondicional, país onde vivo há 16 anos, no qual aprendi a ver os meus pais com outros olhos e a agradecer todos os dias a sorte que tenho.

esta espécie de amor, para mim a primeira e a derradeira, que está antes, depois e acima de todas as outras, é a minha maior fonte de bem-estar. eu alimento-me do amor que sinto, e isso faz de mim uma pessoa feliz. e, se com isto, conseguir que o meu filho seja um ser humano autónomo, seguro e feliz, então também estou de parabéns.

para o lourenço